MATOTA E MARATA – O CASO QUE MARCOU A BAHIA

 MATOTA E MARATA – O CASO QUE MARCOU A BAHIA

Fizemos o caso completo no canal do Youtube:





José Maurino Carvalho, filho do seu Edgar e da dona Maria da qual era dona de casa e cuidava dos 10 filhos. Moravam na Fazenda São Gabriel da Vila de Santo Antônio de Jesus, Salvador – Bahia.

 


O pai de Maurino seu Edgar trabalhava na Fazenda São Gabriel era mão pra toda obra, lavrador, cuidava da horta, arrumava cerca, cuidava dos animais.

 

Um homem extremamente trabalhador e rígido, criava os filhos em rédeas curtas.

 

Autoritário ao extremo, a voz dele era soberana, nem a dona Maria se atrevia a lhe falar alguma coisa. O que o marido dissesse estava falado, sem mais!

 

Seu Edgar tinha problemas com barulho, odiava qualquer som, incluindo as falas da esposa e dos filhos, principalmente risadas...

 

Dentro de casa se falava apenas o necessário, em voz baixa, quase cochichando... ao depender do som que emitiam, um já entendia o que o outro estava dizendo.

 

A família raramente recebia visitas, ou alguém outra pessoa, moravam isolados praticamente.

 

Quase não tinham convívio com outras pessoas, tinham sua maneira única de comunicação, apanhavam se fizessem alguma travessura e como a mão do seu Edgar era pesada demais!

 

Eles nem se arriscavam a querer apanhar outra vez.

 

A família não era religiosa, Maurino nunca presenciou a mãe ou o pai rezando. Embora seu Edgar trabalhasse muito a renda era pouca pra tratar das crianças, por isso a família cansou de passar fome.

 

E tudo piorou quando Leandro o filho mais velho do casal que ajudava seu Edgar foi trabalhar na linha principal da via Férrea Leste-Brasileiro.

 

Que que ligava a estação da Calçada em Salvador até São Francisco em Alagoinhas.

 

A família sempre procurava saber de Leandro que se comunicava através de recados. As notícias eram boas, o guri estava muito bem de vida.

 

Enquanto o restante da família permanecia na fazenda São Gabriel.

 

Maurino foi crescendo não suportando risadas e muita conversa, gostava de morar na fazenda, pois não tinha barulho, nem movimento de pessoas, desistiu de estudar na 3ª série primária.  

 

Mas sonhava em fazer direito e ser juiz quem sabe... 

 

Mas conforme foi crescendo e visto que o irmão estava bem por ter saído do local, passou a sonhar todos os dias em sair daquela fazenda.

 

Maurino era um guri moreno, magro, 1,65 de altura, cabelos castanhos e rosto alongado.  

 


Conheceu uma guria chamava Maria, queria cassar com ela. Mas seu Edgar não a aceitava, que não era boa moça para o filho. Foi assim que mal começou o namoro e teve fim.

 

Depois até se interessou por uma prima, mas sabia que o pai também diria que não era boa moça. Assim desistiu de casar.

 

Entre o final da década de 60 e início da década de 70, Salvador alcançou 1 milhão de habitantes, maioria das pessoas que saíram do interior do estado, partindo pra cidade grande.

 

A economia crescia desde 1939 com a descoberta de um poço de petróleo chamado Petrolifero Lobato e com a criação do Centro Industrial de Arataú em 1967.

 

Como Salvador era a grande oportunidade. Maurino assim que completou 18 anos em 1966, com um pedaço de papel que anotou o endereço de um primo, foi para a capital da Bahia.

 

Quando chegou mal acreditava na quantidade de pessoas passando. Tudo muito diferente da vida na fazenda, ali havia prédios, movimento, muitas casas e as pessoas falavam bonito.

 

Se alistou no exército em Salvador. Era o que queria, militares não sorriam e tinham disciplina.

 

Mas as coisas não foram como Maurino imaginou, no exército não deu certo, bem como morar na casa do primo.

 

Passou a morar sozinho, no bairro do IAPI. Conseguiu 2 empregos. Pela manhã trabalhava na sorveteria e a noite em um bar do Bonfim.

 

Depois de um tempo conseguiu um emprego no Restaurante Fronteira e trabalhava em tempo integral, servia bebidas, limpava mesas, atendia os clientes e percebeu que era preciso falar. Somente resmungar não era mais possível.

 

Voltou a estudar e quase concluiu os estudos, porém exausto de trabalhar o dia todo e por vezes passar da hora no trabalho acabou desistindo do restante do curso.

 

Estando morando a 3 anos na Capital, já com 21 anos teve pela primeira vez uma relação sexual, foi tudo meio rápido e sujo, depois do ato ficou preocupado de ter pego uma doença.

 

O que fez com que ele ficasse com tanto medo que por quase um ano não queria mais nem conversar com mulher nenhuma. Depois foi indo e perdeu o medo.

 

Passado algum tempo conseguiu um outro trabalho como entregador na loja Móveis PORVIR. Maurino gostava muito do serviço e os patrões o adorava.

 

Ele andava por todo bairro de Salvador, entregando móveis, tirando pedido.

 

Via de tudo! Crianças brincando de futebol, marinheiros, mulheres, homens de paletó, homens de roupa toda branca e os homens de paletó com bíblia debaixo do braço.

 

Gostava de ficar vendo as pessoas passarem nas ruas, parava pra rir dos crentes que passavam com a bíblia debaixo do braço gritando que Deus voltaria e que o fim estava próximo.

 

Mas um dia prestou atenção em um homem que falava sobre fé, castigo e arrependimento, nem prestou muita atenção ao que ele dizia.

 

Mas o que lhe encantou era como as pessoas olhavam aquele cidadão com respeito e reverência.

 

E pensou... se um dia fosse crente, ia ser crente mesmo, sem pecar de jeito nenhum.

 

Ganhou uma bíblia de capa preta, bastante usada do colega de trabalho da loja de Móveis, foi até a Igreja Batista Missionária, que ficava em uma sala muito simples, logo passou a ir com frequência pois gostava de ouvir as pregações.

 

Mas teve um culto que mudou a vida de Maurino. No instante que o pastor Jurandir leu uma passagem do Evangelho:  

 

– Jesus disse: “Ninguém vem ao pai, senão por mim”. Alguém aqui deseja seguir o Cristo, meus irmãos? Quem acredita, irmãos?

 

E o povo ali presente disse:

– Eu creio!

 

Maurino parecia estar em transe, as lágrimas lhe escorriam pelo rosto. Nesse momento, sentiu que uma fé, que nunca supunha possuir, crescia dentro dele. Experimentou uma tranquilidade que nunca havia sentido.

 

 

Nessa confusão de sentimentos, teve certeza de que aquela felicidade era a grandeza de Deus que lhe dava força, lhe dava a crença.

 

À medida que se sentia mais arrebatado, mais emocionado a cada culto, notava que se transformava em um crente completo.

 

Maurino ouvia os sermões na Igreja com grande zelo principalmente quando Abraão foi chamado por Deus para formar seu povo, a partir dele, mas fez uma exigência:

 

 Pediu uma prova da fé a Abraão, ele não duvidara e ofe­recera a vida do único filho em sacrifício.

 

O velho pai conduzira por dias o filho Isaac pelo deserto e, só na hora em que o machado lhe tocaria o pescoço, Deus intercedera. Estava provada a fé daquele homem!

 

Outra pregação que ficou gravada em Maurino foi no novo testamento, no livro de Paulo, quando é citado a história de Saulo. Capítulo 13, versículo 9:

 

Era um furioso perseguidor dos cristãos até que a voz de Jesus lhe pede que obedeça somente a Deus.

 

Depois de ficar cego por três dias com a luz que irradiava de Jesus, foi curado, Saulo se converteu e mudou o nome para Paulo.

 

A partir dali Maurino prometeu que também buscaria ser santo como Abrão e apóstolo como Paulo.

 

Passado um tempo Maurino resolveu se demitir da Loja Porvir de móveis e abrir um negócio próprio, aprendeu como anunciar produtos e a falar melhor com os clientes.

 

Em meados da década de 70 era raro quem tinha tv colorida, ele por sua vez passa a vender telas plásticas de aparelhos de TV. Bastante gente que tinha televisão preta e branca compravam essas telas.

 

Vendia bem e geralmente visitava Feira de Santana, conhecia comerciantes no local, inclusive ia a igreja também nessa cidade.  E foi em Feira de Santana em 1975 que Maurino viu Maria Nilza pela primeira vez.

 

Foram apresentados pelos amigos da Igreja. Ela com 20 anos, aparência frágil, 1,58 de altura e cabelos castanhos.

 

Mas estava em Feira de Santana na casa de amigos da igreja, da qual os conheceu quando morou com a família por um tempo na cidade.

 

Quando se conheceram Maria Nilza havia ido até Feira de Santana para buscar uma certidão no colégio em que havia estudado para obter a transferên­cia para a antiga escola em Barra.

 


Maria Nilza nasceu em Junho de 1954, Filha de seu Fideles, um homem que trabalhava no campo e dona Izabel que era dona de casa, possuía 2 irmãos homens.

 

Foi uma criança quieta, não gostava de brincar, tinha mais irmãos e todos se davam muito bem. Não brigavam entre eles e nem os pais se brigavam, a família era ótima.

 

O pai nunca a agrediu, sempre deu exemplo e conversava muito com os filhos para nunca fazerem nada errado. Natural da Barra a família era católica, sempre gostou de estudar, era ótima aluna.

 

Fez curso de datilografia e culinária.

 

Mas a família foi surpreendida com a doença da mãe, do dia pra noite a mulher não falava, a boca ficou torta e se tornou acamada.

 

Foi diante disso que a família saiu da Barra de Mundo Novo para Feira de Santana em busca de recurso para essa mulher.

 

Quando isso ocorreu Maria Nilza tinha 15 anos.

 

Os médicos não davam jeito, diziam ter sido um derrame. Mas segundo Maria Nilza ela sabia que aquilo foi feitiçaria. Foi quando ela chamou um pastor e virou crente. Passou a fazer parte da Assembléia de Deus, lia a Bíblia e fazia pregações.

 

Mas deixou de estudar no 3º ano primário, segundo ela decidiu seguir as Leis do divino: sabedoria vem de Deus.

 

Não era vaidosa, não tirava sobrancelha, nunca pintou as unhas, não gostava de roupas da moda.

 

Por fim, a família de Maria Nilza volta a morar na Barra de Mundo Novo, cidade natal dela. A mãe nunca se recuperou da doença e viveu acamada. Era Maria Nilza quem cozinhava, servia a mãe e lhe dava banho.

 

Quando insistia em viajar para Feira de Santana era seu Fideles que tomava conta da casa e da esposa. Desde o ocorrido ele não saia mais de casa a não ser para trabalhar.

 

Conhecendo então Maurino os dois passaram a conversar um pouco sobre suas vidas, o quanto eles tinham algo em comum, como eles haviam parado na igreja.

 

Conversaram sobre passagens bíblicas e rapidamente Maria Nilza contou a ele que desde pequena o Espirito Santo a usava a fim de transmitir mensagens através de sua boca, sabia que as coisas aconteceriam antes mesmas de elas acontece­rem.

 

Maurino disse a ela que uma vez estava dormindo e quando acordou viu um monte de anjinhos, uma porção deles, em torno da cama. E que um homem ao lado, em pé, olhava pra ele.

 

Teve certeza de que era Deus. E também de como, depois desse dia, passou a conversar com Ele, que lhe falava através do Espírito Santo, de como estava magoado com os homens, e sobre a missão dele no mundo.

 

No mesmo dia começaram a namorar. Maurino voltou para Salvador e quando ia a Feira de Santana encontrar com Maria Nilza que ainda estava resolvendo as pendências antes de voltar para Barra.

 

Quando se encontravam ficavam falando sobre a Bíblia, iam juntos até a escola dominical e depois saiam pelas ruas a pregar. Às vezes, ele nem sabia o que tinha de falar, mas Nilza, sempre ao lado, lhe sussurrava o que ele deveria dizer.

 

No fim daquele mesmo ano em que Maurino conheceu Nilza, enquanto ele voltava pra casa caminhando, ao dobrar a esquina viu um homem todo de branco, rosto iluminado, tinha  certeza de que via o Cristo.

 

Começou a chorar, uma felicidade que saberia descrever. Deva­garzinho a imagem foi sumindo, e no lugar que antes o homem ocupava, do outro lado da calçada, vislumbrou a figura de Nilza claramente a sua frente.

 

Teve certeza de que era uma predestinação e um desígnio de Deus ter ela durante toda a vida.

 

Foi assim que decidiu casar com Maria Nilza, falou com ela que ambos deveriam obedecer à von­tade divina, e ela deveria ir até Salvador encontrá-lo. Ela por sua vez aceitou o pe­dido.

 

Um dia Maurino passando de ônibus em um local chamado Lagoa do Abaeté e sentiu que ali era um lugar escolhido por Deus, ele desce do ônibus e fica ali rezando chamando o local como Monte das Oliveiras.

 

Segundo ele ouviu de Deus que ele teria uma missão na Terra, da qual não poderia fugir. Deveria reunir um grupo para viver de acordo com os seus mandamentos.

 

Ainda ouvira Deus lhe revelar que logo depois do casamento Maria Nilza engravidaria e seria um menino, um santo. Como Jesus e o povo seguiria.

 

E nesse local que ocorre o casamento de Maurino com Maria Nilza. Sem convidados, sem os pais, sem pastor para abençoar.

 


Afinal não havia na terra um homem sequer capaz de sacramentar aquela união, que não o próprio Deus.

 

E foi assim que Maurino e Nilza juraram fidelidade sob o amor de Cristo, o poder de Deus e a força do Espírito Santo.

 

Trocaram seus nomes, em inspiração bíblica. Foi assim que Maurino passou a ser MATOTA e Maria Nilza MARATA.

 

Se deitaram ali no Monte das Oliveiras e fizeram o que Deus havia mandado que seus filhos fizessem.

 

O pecado original estava perdoado. Tudo conforme a Lei de Matota e Marata. Casados foram morar juntos na Barra de Novo Mundo em 1975.

 

A cidade de Mundo Novo estava em progresso, desde 1937, quando foi inaugurada pela companhia Leste Brasileiro a estação ferroviária.

 


Isso movimentou o comércio e trouxe emprego a população. Muitos saíram de pequenos vilarejos para a cidade.

 

Havia movimentações no comércio devido aos viajantes que precisavam passar a noite nas pensões para no dia seguinte pegar o trem.

 

Eram ruas iluminadas, calçadas, casas lindas, prédios, comércios, pousadas.  

 

Porém nos anos que se sucederam, o avanço do transporte rodoviário o povoado foi enfraquecendo a cada vagão que chegava vazio, que por sinal foi extinto em 1978.

 


O próspero povoado em pouco tempo passou à condição de lugar abandonado, pobre e miserável.

 

 

Onde Maria Nilza agora Marata morava era um pouco diferente da cidade.

 

A Barra de Mundo Novo ficava a 5 KM estrada de barro, poucas casas de reboco descascado, as paredes manchadas pela poeira do barro ala­ranjado, ruas ruins, dois botecos e alguns armazéns. 

 

O vilarejo tinha um pouco mais que mil habitantes.

 

O casal chega na casa dos pais de Marata ainda de madrugada e quem abre a porta é o próprio pai.

 

Seu Fidélis que fica aliviado com a chegada da filha, mas para sua decepção estava acompanhada de um guri que de cara não lhe agradou.

 

Marata apresenta ao pai o Maurino, como seu namorado e não marido. Esse pai olha já vê que o guri tinha uma mala na mão... pensou é grota!

 

Marino foi apresentado também a sogra e aos irmãos de Marata que eram dois guris de 18 e 22 anos.

 

Eles viviam numa casa simples, feita de barro, chão batido, com dois quartos uma sala e cozinha.

 

Matota queria fazer com o sogro um acerto de casamento. Mas seu Fidélis que não tinha papas na língua já disse que ele não era homem para sua filha, que ele mal se sustentava como iria sustentar Maria Nilza.

 

Deixou claro que não estava de acordo. Alertou a filha a acabar com aquele casamento e ainda disse: O CEDO TEM JEITO, O TARDE NÃO!

 

O Matota e a Marata ficavam juntos o dia inteiro. Cantavam os hinos de adoração, freneticamente batiam palmas, rezavam daqui a pouco cantavam de novo. Era uma gritaria dentro de casa.

 

Só paravam para ir à igreja em que Nilza frequentava.

 

Em torno de 1965 chegou de trem um grupo de crentes que se tornaram novos moradores de Mundo Novo. Formaram uma congregação, ergueram a igreja chamada Pentecostal As­sembléia de Deus.

 

Os cultos proferidos pelo pastor Agenor, da Igreja Pentecostal Unida do Brasil, em Mundo Novo. O mesmo era dono da Barbearia Menezes, no centro da cidade.

 

Vez ou outra viajava até Barra para ministrar os cultos, que Marata frequentava. Ele dizia que o diabo se escondia por trás da cerveja e entre a fumaça do cigarro, quando o tinhoso soprava a alma do infeliz.

 

Era comum que ao início dos cultos, ele perguntasse se algum dentre aqueles irmãos ainda não havia aceitado a Jesus.

 

Quem por vontade, ou por acidente, levantasse a mão, logo era inquirido a dar o seu depoimento de pecador e convidado a aceitar a Deus.

 

Matota chegou a dar alguns testemunhos na igreja que comovia a todos, era fervoroso na fé e chamava o Espírito Santo.

 

Seu Fidélis percebe que passou-se dias, semanas e meses e nada desse guri procurar um serviço ele toma iniciativa. Chamou Maurino para trabalhar no roçado de um pasto que precisava de gente.

 

Seu Fidélis só olhando o jeito do curtido da preguiça, cada foiçada que dava no mato era um suador, parava pra descansar. Ele se perguntava como aquela criatura foi criado numa fazenda daquele jeito.

 

Nem roçar um pasto, não sabia era nada. Lerdo que Deus o livre.

 

Chega o fim do dia eles no caminho de casa o Maurino vulgo Matota mostra a mão pro sogro. A mão estava cheia de calo e inchada. Já avisou o seu Fidélis.

 

Não adianta querer me botar pra trabalhar porque Deus não quer que eu trabalhe não adianta teimar. Isso aqui é um aviso de Deus, ele vai prover meu sustento eu não preciso trabalhar.

 

Chegou em casa mostrou as mãos pra Marata, logo já foi dizendo que aquilo eram as chagas de Cristo que ele não podia trabalhar, aquilo era um aviso de Deus e ele não cometeria mais esse pecado de pegar nem se quer uma enxada na mão.

 

Era hora de pregar e formar seu rebanho. Era pra isso que ele estava ali, fazer seu dever nessa terra. Nesse momento já sentiu a presença de Deus invadir o quarto em que estavam.

 


Qualquer feixe de luz que ele via entrar pela janela era o espirito santo. E realmente não foi mais trabalhar. Mas era preciso conseguir fiéis, o povo escolhido de Deus.

 

E foi Marata que leva Matota até a Fazenda Havana, onde tinha amigos que moravam lá e eram trabalhadores.

 

Que inclusive já apresentava sinais de gravides, o que fez com que Matota tivesse ainda mais certeza do que Deus havia falado que logo eles teriam um filho, que seria santo.

 

A Fazenda Havana localizada na Barra de Mundo Novo, no estado da Bahia era destaque na região de Salvador na década de 70 pela criação de gados nelore.

 

Eram mais de 600 cabeças de gado, distribuídos em grande extensão de terra.

 

O dono das terras era seu Vavá um senhor já de idade que passava a maior parte do tempo em Salvador, jamais conseguiria dar conta de tudo aquilo sozinho.

 

Tinham muitos empregados, desde vaqueiros, lavradores, serventes e bastante trabalho a fazer, quem o ajudava a administrar era seu filho Alberto Teles da Silva, mas que também ficava em maior parte do tempo na capital.

 

Contavam com a ajuda de Godofredo, apelidado como Godô, que já tinha mais de 50 anos, pai e filho tinham muita confiança no homem que realizava os pagamentos de funcionários e contratação de trabalhadores, era ele também quem distribuía as tarefas.

 

Parte dos trabalhadores moravam em pequenos vilarejos dentro da grande fazenda, suas casas eram feitas de barro secados ao sol como a casa de Marata.

 

O grupo composto por 20 adultos amigos de igreja de Marata são apresentados ao Matata como pastor. Ele por sua vez fez questão de falar um pouco de Deus, mas isso foi ocorrendo aos poucos.

 

Matata ia num dia, depois outro... falava sobre como o demônio perseguia as pessoas que pecavam e as que tinham vícios, cachaça, cigarro e afins.

 

Mas isso irritava muitas pessoas que estavam trabalhando.

 

Cada intervalo que os trabalhadores tinham e paravam lá vinha Matata pregar a palavra de Deus. E por fim virou piada na boca de muitos funcionários.

 

Algumas vezes havia discussão, pois havia pessoas que não toleravam mais aquilo. Simplesmente não queriam virar crente!

 

E quando a coisa ficava feia ele esperava um tempo e ia novamente na fazenda, mas junto a Marata. Tinha gente já tão enojado daquilo que mudavam de roçado pra não ouvir nem o que ele dizia. Era perturbador.

 

Matota dizia que Deus punia aqueles que não o obedeciam que a terra poderia devora-los  em um segundo...

 

Ou uma bola de fogo desceria dos céus e transformariam cada um ali em cinzas que o gado lamberia junto ao sal grosso.

 

Depois passava a falar línguas estranhas que ninguém entendia. O pastor Matota parecia em transe e Marata traduzia para o povo o que ele dizia.

 

A Marata que todos conheciam estava diferente, falava de um jeito duro, firme, as vezes agressivo, os olhos pareciam saltar do rosto. Ficavam assustados com ela. A maioria ali tinha muitos vícios.

 

Gastavam o dinheiro de um mês de trabalho em festa e bebedeira. O pastor Matota falava que não podiam mais ir à festa, nem ficar em venda conversando, pois era nessas horas que o “cão passava o rabo”.

 

Durante a tradicional festa de carnaval no Clube Lyra, nem passar perto da cidade nesse dia podiam, pois o maligno estava solto. Aos poucos, os homens foram mudando de comportamento.

 

Não gastavam mais o dinheiro da roça em cachaça, até o cigarro de fumo, que antes mesmo as mulheres costumavam fumar, foi deixado de lado. As vaidades das mu­lheres também foram ficando esquecidas.

 

 

Fato é que todo mundo havia mudado, começaram a ouvir Matota aquele homem de Deus  E, além disso, ninguém queria ser destruído por Deus se não obedecessem a Ele e a eles.

 

Sim porque eles precisavam fazer o que o casal dizia, eles sabiam tudo o que Deus dizia.

 

O Espírito Santo falava com eles direto e eles eram o caminho da fé, um homem abençoado e santo.

 

E cada visita que ele fazia a fazenda as pregações eram cada vez mais exigentes como o uso de relógio, não pode porque os apóstolos de Cristo não usavam.

 

Passado um tempo o pastor Matota começou a falar sobre a necessidade de se juntarem. Porque Deus queria seus filhos mais devotados sempre juntos, para não ficarem vulneráveis.

 

E quem não fizesse parte não seria salvo. Fato é que quando aquelas pessoas se deram conta já estavam tentando convencer os outros a também seguirem a Igreja Universal Assembléia dos Santos.

 

Maria da Paz casado com Godofredo o Godô gerente da fazenda e Maria Alves haviam sido as primeiras a aceitar as prega­ções do jovem pastor.

 

Assim como as outras mulheres do grupo, servi­ram de ponte para que os maridos e irmãos, homens, aceitassem obede­cer ao jovem casal.

 

As duas irmãs se pareciam bastante: a pele morena quase negra, os cabelos crespos. Não tinham mais do que um metro e cinquenta centímetros de altura.

 

A vida na casa de Seu Fidélis ficava insustentável a cada dia. O pai de Marata não aceitava aquele jeito que eles levavam a vida. Ficava até com vergonha quando os dois saiam para pregar na rua.

 

Fim de Novembro quase virando Dezembro, nasceu a FILHA do casal, de parto normal. Marata colocou o nome de Biulene.

 

Mas Matota trocou o nome para Morotó. Ou seja, nome masculino. Ficou decepcionado com Deus que havia dito que seria um menino.

 

Mas ouviu que Deus o explicou que na verdade Biulene era menino, Deus o castrou na barriga de Marata para que ele se mantivesse puro, um santo.

 

Após o nascimento da criança, todos, inclusive o velho, tiveram de tratar a criança como se menino ela fosse. Se falassem que Morotó era uma menina.

 

A raiva descontrolada que tomava conta do pai era tão grande, que ninguém quis despertar aquela ira outra vez.

 

Maurino enchia o peito de orgulho em falar que o filho havia nascido com três dons divinos: a sabedoria, a ciência e a fé.

 

E dizia para quem quisesse – e também para quem não quisesse ouvir, é verdade – que o filho não se casaria porque teria de cumprir a missão dada por Deus.

 

Matota e Marata decidiram sair da casa do seu Fidélis levando com sigo seu filho. Foram morar na casa de duas irmãs da igreja, Maria da Paz e Maria Alves.

 

Ali teriam espaço para cuidar do pequeno em um lugar abençoado por Deus e também para reunir o grupo de escolhidos que já se desenhava.

 


Se instalaram em um quarto pequeno, sem janela, sem ventilação, em uma cama de solteiro, assim se abrigaram Matota, Marata e Morotó.


Maria Alves era a única das 4 irmãs solteiras. E como já dito morava com a irmã Maria da Paz.  Além das duas na casa...

 

Haviam outras quatro crianças viviam: José Carlos, Rosemeire e Ledina 9 anos que trabalhava na fazenda, fi­lhos de Maria da Paz com um rapaz chamado João com quem teve um primeiro relacionamento.

 


E Núbia fruto 2º casamento de Maria da Paz que trabalhava como doméstica na fazenda que era casada com um homem 30 anos mais velho que ela.

 

Godofredo tinha 56 anos,  gerente da fazenda, o braço direito do velho Valdomiro Brandão.

 

Godofredo natural de Feira de Santana, chegou ao povoado já haviam 10 anos. Era responsável pelo pagamento dos outros trabalhadores, foi contratado como gerente da fazenda pelo filho de Seu Vavá.

 

Morando na casa das duas irmãs, o jovem pastor já possuía alguns se­guidores. Sua religião era chamada de Universal Assembleia dos Santos.

 

As promessas dos castigos divinos e a sedução pela libertação do espírito aglutinavam pouco mais do que dez pessoas.

 

Geralmente quando falava linguas estranhas e a Marata traduzia mais pessoas que se convertiam. Quem não os seguisse poderia ficar louco, cegos, doentes.

 

Tudo de ruim cairia sobre a vida das pessoas eles eram enviados diretos de Deus e o espírito Santo presente com eles avisava aquela gente que entrasse para a religião enquanto fosse tempo.

 

Era simples! somente seguir a Deus e ouvir o que eles diziam, ser obediente se não tudo poderia ser destruído e as pessoas com medo passavam a seguir o casal.

 

Matota passou a trocar os nomes dos discípulos Pedro passou a ser Fanuel.   Inclusive o casal era chamado de Marata e Matota.

 

Um dos lavradores se chamava José Catarino e era casado com Dona Almerinda. Já estava na velhice, beirando os 68 anos, quando foi conven­cido pela mulher a ouvir as pregações do pastor Matota.

 


Os dois haviam tido 16 filhos, embora apenas dez tivessem conseguido sobreviver até aqueles anos. Pais e filhos viviam dos serviços dispo­níveis nas terras de seu Vavá.

 

Dos sete filhos 2 se juntaram a Universal Assembleia dos Santos.  Janilton 21 anos e Marilene 24 anos, única mulher da família e tivera uma filha com um homem da região. A pequena Már­cia tinha três anos.

 

Também na fazenda viviam Lourisvalda e Romildes, que eram irmãs de Maria Alves e Maria da Paz. As quatro eram filhas do velho Sérgio Alves Araújo e de Dona Arlinda.

 


Os pais viviam em Barra e, desde o nascimento do quinto filho de Maria da Paz, cuidavam da criança com o amor desobrigado e generoso que avós naturalmente sentem pelos filhos de seus filhos.

 

Depois de certa insistência das filhas, Dona Arlinda ha­via ido a alguns cultos na Fazenda Havana. Porém, o marido não havia gostado nada dessa história de ela acompanhar pastor depois de velha e acabou desistindo de seguir a nova religião.

 

 Romildes, a segunda filha do seu Sérgio e da dona Arlinda, era casada com Pedro, vaqueiro da fazenda.



Trabalhava lá quan­do conheceu o esposo, que naquela época já beirava os 30 anos, mas que ainda era muito bem apessoado em comparação aos outros da fazenda.


Estavam casados há três anos, e tiveram dois filhos: Andréia e Samuel.

 

A outra irmã, Lourisvalda, era casada com Dario que era vaqueiro tinha 28 anos era natural da cidade de Baixa Grande, vivia na Barra fazia 10 anos. Tinham três filhos: Marivaldo, Sérgio e Cleide.

 


Também fazia parte da nova igreja, a doméstica Floraci, que era casada com o Nane, também vaqueiros da Fazenda Havana.

 


Logo que a mulher decidiu aderir ao grupo, o vaqueiro se opôs à religião. Depois de muitas brigas, Floraci 36 anos decidiu abandonar o marido e ir viver na fazenda com o grupo.

 

Lá, conheceria Adilton 19 anos, filho de José Catarino, com quem se juntaria.

 

 


O outro membro da religião pregada pelo jovem casal era José Alves. O rapaz de mãos grandes tinha 17 anos e, há dois, realizava pequenos serviços de limpeza na propriedade de seu Vavá.

 


Jesus havia escolhido os seus apóstolos. Eram 12, ao todo. Homens sim­ples, pescadores, carpinteiros, escolhidos no meio do povo.

 

Matota tam­bém havia escolhido as ovelhas do seu rebanho da terra mais seca, das dores mais cruas, prontos a se deixarem guiar por quem se apresentava como enviado de Deus.

 

Homens, mulheres e crianças obedientes na fé e no temor dos castigos do divino. E avisou:  só entrarão no reino dos céus aqueles que se comportarem feito os apóstolos do Cristo.

 

Os pequenos cultos passaram a ser realizados, com bastante freqüência, no terreno amplo e arejado que circundava a sede da Fazenda Havana.

 

O pastor Agenor fica sabendo do ocorrido e nada se agrada, parte para a fazendo para falar com Godô.

 

Falou ao administrador que não aceitava que ele um homem instruído, pudesse ser envolvido tão facilmente por esse Matota e que todos estavam iludidos também o chamando de pastor.

 

Mas Godô ficou do lado de Matota. O pastor por sua vez foi embora. 

 

Matota e Marata ficavam na casa da Barra das duas irmãs sempre em oração, mas dentro de casa era aquela gritaria, e sons que eles emitiam como se estivessem em transe. Eram falas que ninguém entendia.

 

Os vizinhos não suportavam mais aquilo, achavam estranho e inclusive tinham até medo. Crianças jogavam pedras e areia na casa para que o casal parasse com aquilo. Certo dia um homem perdeu a cabeça.

 

Invadiu a casa com um porrete agrediu Matota que saiu correndo pelas portas dos fundos e voltou só de madrugada.  Estava difícil para eles permanecerem no povoado da Barra.

 

E foi diante disso que o pastor Matota diz para Godô : Josué trate de fazer uma instalação, arrumar um lugar na fazenda para que todos da igreja morasse juntos. Isso mesmo! Todos na mesma casa.

 

Assim é a vontade de Deus, onde o pão fosse repartido de uma só vez.

 

Agora Godô já era Josué!

 

E assim foi feito, as irmãs deixam a casa do vilarejo, junto as crianças e o casal. Lá dentro das terras de seu Vavá ficam todos morando em uma casa só.  

 

Maria da Paz que tinha os 4 filhos com ela e mais 1 menino que morava com os avós, retirou deles a criança. Levando para morar com o grupo.

 

A casa era ampla, tinha curral, horta, e ficava em um local mais escondido. Então o grupo podia gritar, fazer seu culto que ninguém ouvia.

 

As regras quem dava era Matota, logo cedo todos acordavam e iam para o campo. Menos mulheres e crianças. E ele obviamente. Deixou claro que o lugar dele era em casa lendo trechos da bíblia e orando, vigiando, pois o demônio é esperto! Não dá pra facilitar!

 

As que trabalhavam na fazenda pararam de trabalhar, só os homens trabalhavam. Quem ordenava as crianças era ele.

 

As crianças eram tentadas pelo demônio, caso fizessem algo errado que ofendesse a Deus seriam castigadas, essa religião única precisava ser seguida à risca. Primeiro mandamento é todos o obedecerem.

 

Por isso, ele que os castigaria quando algo estivesse errado. Os pais não tinham mais autoridade pelos filhos.

 

Além disso, durante o dia as mulheres faziam o serviço doméstico e olhavam as crianças. Enquanto Matota e Marata saiam sozinhos para conversar.

 

A noitinha quando os trabalhadores chegavam cansados começava o culto dentro da própria casa e diariamente. As vezes se estendia até de madrugada.

 

Era preciso muita oração, todos os dias surgia um aviso novo de Deus.

 


Mas na hora de dormir ocorria um negócio assim... O pastor Matota ouviu Deus dizer que ele deveria dormirrrrrrrrrr com a mulher x da casa. Se Deus disse quem era marata para impedir... Claro que pode Deus mandou.

 

Os maridos também concordavam das esposas dormirem com o pastor, porque Deus mandou.

 

Deus manda cada coisa pra essas pessoas...

 

Os homens podiam também dormir com a esposa do outro, mas nesse caso era Marata que escolhia. Então esse era o divertimento da galera toda noite.

 

O local era muito bagunçado, sujo, arrevirado, ninguém tinha mais nenhuma vaidade, não se cuidavam em nada. Por que para Deus não havia necessidade.

 

Um dia ao meio dia Pedro esposo de Romides foi almoçar quando Matota o chamou de Fanuel. A partir dali era seu novo nome.

 

Até que ordenou a todos que fossem comprar roupas para o batismo, todos iriam juntos! Homens terno branco, calça branca e as mulheres blusas e saias brancas e compridas.

 

No dia marcado foram a um açude, todos juntos tiveram seu batismo na água escura.

 

Ao mesmo tempo que batizava trocava o nome de cada um, todos teriam que ter um nome bíblico, ali morria o pecador e nascia o homem santo.

 

Menos 2 dos religiosos trocaram o nome, pois o pastor não viu necessidade já que eram nomes santos.

 

Pretendia Matota escrever uma bíblia, no batismo ordenada todos a falarem línguas estranhas, cantavam gritavam, oravam e naquele fervor foram estradas a fora em direção a fazenda cheios de fé, cantando e falando o que ninguém entendia.

 

Maria Alves que era a irmã solteira de Maria da Paz teve por determinação do pastor Matota o casamento com Antônio Davi filho do seu José Catarino.

 


Desde que Maria da Paz levou o neto seu Sérgio não tinha paz na vida. Ouvia o povo falar como o pastor Matota odiava crianças.

 

E ele tinha razão por cada sono perdido. Pediu ao padrinho do menino ir até a fazenda escondido e roubar o neto.

 

E assim esse padrinho o fez, durante o culto conseguiu chamar o menino e perguntou se ele queria ir embora com o avô. Imediatamente ele subiu no cavalo com o padrinho e foi de volta para a casa do seu Nelson.

 

Matota e Marata castigavam as crianças. Amarravam as mãos deles com um ramo de urtigas, batiam nas crianças, elas por sua vez, choravam e gritavam com a queimação e ar­dência provocadas na pele.

 

Ele mandava as crianças não chamem para aqui o Satanás. Ali era um lugar de Deus. Ficava quase louco com os gritos das crianças.

 

Os pais, ao que parece, temendo que o casal descarregasse sobre eles um castigo, nada faziam para impedir o sofrimento dos filhos.

 

Matota percebendo os pais olhando aquilo repreendia a todos: Essa criança é uma pecadora. Não tenham pena, somente sofrem os que não têm Deus como o Salvador!”

 

Em Novembro de 1976 em período de eleição para prefeitos e vereadores nem se tornou o foco.

 

Quem roubava a cena era o grupo religioso que cada vez mais era falado no povoado da Barra, era padre, fiéis, pastores, polícia, populares, todos falavam das loucuras do grupo.

 

E que inclusive moravam todos na mesma casa podendo trocar de parceiros e parceiras assim que lhe dessem vontade. Isso era liberado! Até ai não tinha muito o que fazer...

 

Os familiares sentiam vergonha até de ir na rua, tudo isso era comentado pelo povo e principalmente sobre as crianças que levavam surras duríssimas do pastor.

 

Mas o que mais chamou atenção dos políticos, foi o fato de Matata mandar os fiéis rasgarem os títulos de eleitor, que absurdo! Os políticos precisavam de votos e a disputa era acirrada.  Obviamente o grupo não foi a votação.

 

Em Janeiro o pastor reuniu o grupo em círculos e mandou que Nane abrisse a porteira do curral onde uma vaca Nelore tinha acabado de parir. Mas que era pra ninguém se mexer, pois ele provaria que Deus estava com eles.

 

Por fim, Nane soltou a Vaca que foi pra cima deles, era gente correndo pra todo lado.  Inclusive Matota e Marata. Depois Matota começou a gritar pedindo a Deus que os castigasse porque ninguém confiava nele.

 

Detalhe que a casa era mantida pelos homens, que trabalhavam e entregavam todo dinheiro para o pastor.

 

Outra questão exercida por Marata foi rasgar as bíblias dos fiéis, disse que aquela não era a verdadeira. A certa mesmo era a de Matota. Ou seja, ninguém lia a bíblia.

 

Acho que nem mesmo o próprio pastor. Que da preguiça nem isso fazia.

 

Inclusive Marata falou a todos no culto que Deus mandou que ninguém mais trabalhasse, todos deveriam começar a sair no mundo e pregar a palavra de Deus.

 

Os fiéis concordavam com tudo.

 

Inclusive que todas as crianças poderiam ser sacrificadas, a qualquer instante. Bastava apenas a deter­minação de Deus.

 

Até que Matota disse que deveriam todos partir para o Monte das Oliveiras onde ele e Marata casaram, morariam todos embaixo de uma tenda e por um tempo teriam dinheiro para sobreviver.

 

Marata deu uma grande ideia. Todos deveriam vender tudo o que tinham, relógio, chapéu, galinha, porco, móveis, gado, tudo.

 

As pessoas venderam o que tinham, juntaram 18 mil cruzeiros, entregaram a Matota dia 16 de Março. Que avisou que no dia seguinte partiriam. Matota fazia questão de dizer que o monte das Oliveiras era local Santo.

 

Pagaram um caminhão para o transporte do grupo, foram correndo na venda da Barra comprar comida para levar. Foi quando Matota que não deixava mais Marata ver a família foi na casa do sogro.

 

Entrou porta a dentro e disse que o velho Fidélis deveria vender a casa e seguir as Leis de Deus. O homem decepcionado com que ouvia, disse que sempre seguiu as leis de Deus, mas que o que eles estavam fazendo era seguir as Leis de Satanás.

 

Imediatamente o expulsou da casa... E viu sua filha correndo para alcançar o grupo sem ao menos se despedir dos pais.

 

Partiram para Feira de Santana dia 17 de Março de 1977, depois para o Arial ou seja, Dunas da Lagoa de Abaeté que fica próximo ao mar. Região de muita areia, quase deserta esse era o tal Monte das Oliveiras.

 

Chegaram as 22:00. O lugar ficava no alto, de onde podia se perceber toda a bran­cura que predominava na areia, que contrastava com o verde das vegeta­ções.

 

Dormiam em uma pequena tenda improvisada com troncos de madeira fincados na areia e pedaços de plás­tico e palhas secas que lhes serviam como lona.

 

Mal abrigados da chuva e dos ventos que sopravam forte por causa da proximidade com o mar, amontoavam-se uns sobre os outros a fim de se aquecerem como podiam.

 

O dinheiro conseguido com a venda dos animais e objetos na Barra havia sido entregue a Matota, que apenas entregava a alguém a quantia exata para que comprasse o alimento de todo o grupo.

 

Dezenas de pães e latas de sardinha eram os produtos mais comprados nas vendas do bairro. Era a única aparição que faziam algum dos participantes naquela comunida­de de pescadores e pequenos comerciantes.

 

Assim que acabasse o dinheiro deveriam seguir aos pares quem era casado, junto aos filhos e andarem de passo em passo para pregar a palavra de Deus e juntar fiéis.

 

Quem era solteiro se juntaria a outro solteiro. Fazendo aquilo que Deus mandava.

 

Na hora que tinha refeição, geralmente preparada em uma panela só, pouca comida, feito fogo com lenhas que catavam. Todos se alimentavam juntos.

 

Mas as crianças enquanto estavam comendo, os próprios pais jogavam areia dentro dos pratos das crianças.

 

Que deveriam comer aquilo com areia e tudo. Sem local pra banho e falta de higiene.

 

Matota afastava-se do grupo com Marata para falar línguas estranhas com Deus. Só o casal se entendia.

 

 Em uma dessas vezes, o homem disse que Deus te­ria ordenado que as crianças possuídas pelo demônio fossem jogadas para os Tubarões e demais peixes. Que comeriam as crianças.

 

Afinal o mau comportamento dos pequenos ocorria porque o Satanás já ha­via se instalado no corpinho delas, e que por isso não tinham salvação.

 

Se não fossem sacrificadas, logo Deus abriria o chão e a terra engoliria todos juntos para dentro.

 

Seguia sempre dizendo que o homem tem de ser santo e o mar é a forma de purificar os cor­pos daqueles que são atraídos pelo demônio.

 

O grupo mal trapilho raramente saiu do local. Uma das vezes partiram para Paripe, com intuito de visitar uma amiga de Matota. Ao chegar no local não encontraram a tal amiga.

 

Como era tarde o grupo se instalou perto de Pedras, onde dormiriam ali mesmo em meio ao tempo.

 

Foi quando a filha mais velha de Maria da Paz chamada Rosimeire de 9 anos, começou a chorar sem parar. Entendia o que estava acontecendo.

 

Tomada pelo desespero de ficar na rua, se instalar na tenda, vendo crianças serem agredidas com bastante violência e ela era a principal a ser castigada, a menina não conteve o choro seguido de soluços desesperadores.

 

Matota totalmente irritado com a garota, ordenou que a mesma fosse abandonada, Deus havia mandado fazer isso. E assim foi feito! Maria da Paz abandonou a filha em meio de um lugar desconhecido.

 

Saíram pé por pé quando a menina ali permaneceu durante a noite sozinha e desamparada.

 

No dia seguinte do abandono Francisco Sales Lima, casado, trabalhava como motorista de uma fábrica de cimentos em Salvador a mais de 15 anos.

 

Morava no bairro Tubarão. Ao sair do trabalho viu uma menina perto de onde se extraia calcário.

 

Pediu para que lhe tirasse dali, não sabia onde estava os pais e nem o grupo. Ele por sua vez a levou pra casa e ela foi recebida como filha.

 

a menina contara que vivia com um grupo na praia, vindos do interior, e que as crianças seriam jogadas ao mar.

 

Não sabia a quem tinha desobedecido, mas como era sempre alvo dos castigos seve­ros do grupo, dissera que este fora o motivo de seu abandono.

 

No dia seguinte foram até a Delegacia de Jogos e Costumes.

 

Como não havia o que ser feito por lá, o atendente lhe sugeriu que fossem até o Juizado de Menores, onde pode­riam entrar com pedido de adoção, se essa fosse a vontade do casal.

 

A menina permaneceu com o casal até o próximo acontecimento.

 

Enquanto isso na fazenda do seu Vavá perceberam que o grupo de religiosos não apareciam no trabalho foram verificar o que ocorrera.

 

Como o grupo vivia isolados dos demais, ninguém mais ia até então no vilarejo. Ao partirem para o local que dava acesso a moradia do grupo de religiosos.

 

Perceberam o quando o capim havia crescido e a região tomada pelo matagal, ao redor das casas era muita sujeira, objetos jogados em todo lugar, pilhas de roupas pelo chão, xixi e estrume dos animais escorria estrada a fora.

 

Verificaram o quanto o lugar estava imundo e abandonado, não havia mais sequer nem um broto de feijão ou milho, quintal estava seco, prova viva que o grupo de 21 pessoas adultas, haviam abandonado o local.

 

O restante de funcionários se sentia aliviados com a partida dos religiosos, ninguém sabia de seus paradeiros.

 

Quem fugiu com o grupo foi o Godô, até então administrador da fazenda, por isso seu Vavá deixou as terras estavam sob cui­dado de um novo gerente.

 

Luís Guimarães, um homem do povoado da Barra que havia sido indicado às pressas para reorganizar as terras, até que novos funcionários fossem contratados.

 

Quem acabava chegando novamente na fazenda é José Alves. Que pede que seu Vavá o desse a oportunidade de voltar ao trabalho. Como a fazenda estava com desfalque de funcionários seu Vavá o aceitou novamente.

 


O guri por sua vez conta ao patrão o que ocorria com o grupo. Seu Vavá incrédulo com tudo que o rapaz contou, acreditou que tudo era fantasioso e disse para que continuasse seu trabalho na fazenda.

 

Mas na verdade José Alves sabia que de fantasia aquilo não tinha nada!


Assim que Matota anunciou que as crianças seriam jogadas, Eloquis esposa de Pedro foi correndo conversar com o pastor e implorar pela vida dos dois filhos. A resposta foi uma ameaça de que, se ela insistisse, a mesma seria jogada aos peixes. Assustada, recuou e esperou pelo dia junto ao restante do grupo.

 

Durante a manhã. Era o período do dia dedicado às orações e aos cânticos de louvor a Deus. Vez ou outra, Matota ou a mulher condu­ziam o culto falando em línguas que só eles entendiam.

 

Afastavam-se do grupo para algum canto das dunas e, quando voltavam, era comum que trouxessem uma vontade do Deus ou um castigo a ser aplicado nas crianças a quem chamavam de demônios.

 

Mas os próprios pais das crianças chamavam eles de demônios. Então era o dia todo demônio pra cá e demônio pra lá... que Deus falou com Matota e Marata. Dia 29 de Abril daquele ano o casal de pastores se afastaram do grupo em direção à praia.

 

Matota e Marata voltaram dizendo que estava próximo o dia em que seriam sacrificadas as crianças. Alertou que ninguém fugisse, nem mesmo tentasse esconder os pequenos. Se isso ocorresse, seriam atingidos pela ira de Deus, que faria com que o Monte se abrisse e todos morressem soterrados.

 

Os seguidores nem sequer conversavam um com o outro com medo que Deus ou o profeta pudessem escutar.

 

Marata era quem dava as ordens para o grupo geralmente. Ela quem determinava datas e horários para cada coisa.

 

Recado que era: Sacrificar os desobedientes.

 

Os desobedientes eram as crianças, que só tinham corpo infantil. Na verdade, ali existia era o demônio. E que precisavam as dois “mãos santas”, foram escolhidos para joga-los ao mar, para purificar suas almas e que reencarnassem novamente.

 

Nessa vida não tinha mais jeito! 

 

Marota explica que as crianças deveriam ser sacrificadas naquele dia, num trecho da praia Stella Maris, onde o mar devolve as coisas.

 

Somente Matota e Marata poderiam jogar as crianças no mar. Cabia aos dois a missão de lançar os pecadores em sacrifício para que reencarnassem como pessoas boas.

 

Passado as 8 da noite Marata, era noite de lua cheia, muita ventania, quando o grupo deixou o acam­pamento em direção à praia. Caminharam mais de uma hora entre as dunas de areia branca. Homens, mulheres e crianças.

 

As crianças ainda dormindo foram carregados no colo pelos pais, outras crianças ainda sonolentas andavam de a pé, outros foram acordados para acompanhar o grupo.

 

Quando chegaram à beira mar ficaram sentados por um bom tempo até que o mar ficasse mais manso.

 

Quase 10 horas da noite Marata entrou no mar até a água chegar à altura da cintura. Assim, ela apontava para a areia e alguém lhe entregava uma criança.

 

A primeira criança foi Andréa, 2 anos, estava dormindo quando Marata a pegou em seus braços. Batizada de Suani pelo grupo, a menina era filha de Fanuel e Romildes, ou Pedro e Eloquis.

 

Marata virou-se novamente para o mar e avançou pouco, com dificul­dade. O mar continuava agitado, e ela não andou muito com receio de perder o equilíbrio.

 

Sem proferir qualquer oração ou expressar algum gesto que simbolizasse uma oferenda, arremessou a criança ao mar a pouco mais de um metro à sua frente.

 

As mãozinhas agitadas em desespero. Porém, sem qualquer resistência, em menos de um minuto, a água a sugou para o fundo.

 

Marata se manteve na água, enquanto Matota pegou o menino Sérgio, 2 anos, filho de Dário e Lourisvalda, o casal Daniel e Abigail. Andou com ele em direção ao mar e lançou no ar a criança, que sequer acordou. A pequena criança afundou.

 

Em seguida Godofredo carregava com dificuldade sua pequena filha Miriam, 2 anos, que tinha com Maria da Paz.

 


Entrou no mar e entregou a Matota, viu o pastor arremessar a criança que caiu dormindo na água. O corpo já sem vida voltou para perto dos dois.

 

Matota deu ordem a Godô para que fizesse o corpo voltar ao mar e o afun­dasse. Foi assim que ele tocou pela última vez a filha, empurrando para o fundo do mar.

 

Godofredo saiu atordoado da água e se sentou na areia com a cabeça baixa entre os joelhos.

 

Pedro não teve coragem de acordar o filho Samuel de apenas 9 meses, com cuidado entregou a criança ao Matota. Que por sua vez jogou a criança para o alto, fazendo um grande barulho quando caiu na água.

 

Daniel não se conteve em esperar e com a intenção de acabar logo com aquilo entregou a filha Cloude a Matota. A esposa Lourisvalda não falou nada, apenas assistia o marido caminhando até a água com a filha no colo.

 

Inclusive assim como ocorreu com o menino Sérgio do corpo regressar pouco tempo depois de arremessado, aconteceu também com Cloude. Mas dessa vez quem a empurrou para o fundo, foi outro membro da igreja.

 

O mar foi ficando cada vez mais revolto e ninguém mais entregou ao pastor nenhuma criança. Então ele sai do mar e busca a pequena Marta, 4 anos acordada ao lado da mãe que estava sentada.

 

A menina foi levada por Matota para dentro do mar, ele a segurava em seus braços, enquanto as ondas já batiam naquele pequeno corpo.

 

A menina se debatia na água, mas era em vão... acabou cansando, esgotou as forças e o pastor a jogou onda a dentro que afundou rapidamente.

 

Matota saiu do mar novamente foi até o grupo e pegou Marivaldo, 5 anos, também filho de Daniel e Lourisvalda. O casal teve 3 filhos sacrificados naquela noite.

 

O pastor levou o menino dentro do mar onde batia água na altura dos joelhos e arremessou a criança que se chocou no mar, na mesma hora o corpo foi puxado por uma onda para longe.

 

Por fim, Matota voltou até a areia pegou Obede, 8 anos, um menino que era maior, corpo forte, o garoto estava inquieto.

 

Pastor o levou nos braços até o mar, afundou o menino, que começou a se debater. Matota não conseguiu o segurar, as ondas o livravam do sacrifício.

 

Mas o pastor pede para que Pedro e Arão, o Janilton, o ajudassem a manter o debaixo da água.

 

Os três começaram a jogar diversas vezes nas ondas até que o corpo não resistisse mais, infelizmente o garotinho esgotou suas forças e afundou.

 

Durante todo esse tormento o grupo testemunhava o sacrifício. Apenas os ve­lhos José Catarino, o Jacó, e dona Almerinda, Raquel, se negaram a as­sistir o ritual e se afastaram para outro lado da praia.

 

Mas conseguiram ouvir o barulho do mar silenciando os gritos de algumas crianças por um tempo, depois... novos gritos e novamente as ondas.

 

Acabado com a obediência do sacrifício, poderiam voltar para o acampamento.

 

O pastor tentara tranquilizar o grupo dizendo que de nada lembrariam na manhã seguinte aos sacrifí­cios, ordenou que ninguém deveria tocar no assunto. Ninguém chorava!

 

O grupo seguiu em silêncio, apenas rezando como sempre faziam ao longo do dia.

 

No dia seguinte...

 

Dia 1 de Maio, todo o grupo acordou em silêncio, pareciam estar em transe. Não rememoravam a cena, mas ainda que sofressem com as lembranças, dificilmente deixariam transparecer ao pastor.

 

Porém, Pedro não disfarçava, se mostrara abalado. Começou a chorar perto da esposa num canto da praia, quando foi surpreendido pelo pastor. Furioso, Matota saiu gritando aos berros que havia recebido uma mensagem para destruí-lo também.

 

E que ele teria o mesmo fim das crian­ças. Ou pior, seria engolido pela terra. Com medo ele acaba escondendo um facão junto do corpo, para poder se proteger. Mas o pastor acaba descobrindo e tira dele a arma branca e enterra na areia.

 

Pela metade da década de 70 a localidade que ficava entre Salvador e Lauro Freitas começou a ser habitada por pequenos loteamentos e conjuntos residenciais. O que se estende a uma distância de 30 km entre um local e outro.

 


Entre essas localidades encontram-se as praias de Ipitanga e Stela Maris, alguns moradores tinham hábito de acordar bem cedo, ainda de madrugadinha, levantavam e caminhavam a beira mar para retirar objetos que o mar devolvia.

 


Geralmente encontravam objetos que foram usados em oferenda aos orixás, mas quando o mar estava revolto, tinham muitas coisas que chegavam até a beira mar, como tábuas, ferro, metais, garrafas, isopor, plásticos.

 

Eram materiais que poderiam ser reutilizados, aproveitados e até vendidos para ferro velho o que ajudava e ajuda até hoje na renda familiar.  

 

Portanto logo bem cedo haviam pescadores fazendo seu trabalho, alguns moradores a recolher o que o mar entregava. Mas dia 1 de maio de 1977, do qual comemoramos o dia do trabalhador, naquele ano o feriado caiu em um domingo.

 

Geralmente quando o feriado cai estendido as pessoas costumam visitar os parentes, passear... mas naquele ano isso não ocorreu. Portanto maioria dos moradores permaneceram em casa.

 

Inclusive naquele ano na chegada de maio o clima começava a demostrar que o inverno seria mais rigoroso, naquele dia 1 de Maio bem cedo ainda de madrugadinha, quase nenhum morador da região saiu para recolher objetos na beira mar.

 

Mas dona Geraldina resolveu continuar seu trabalho, ela geralmente recolhia o que encontrava para vender, colocou uma blusa de frio, naquela madrugada fazia muito vento.

 

Ela vai caminhando com destino a praia Stella Maris, onde a corrente marítima favorecia o despejo de materiais, todos da região sabiam disso. E assim como até quando chovia lá estava ela firme e forte fazendo seu trabalho.

 

Caminhando ao longe ela percebe algo volumoso na areia, mas com parte ainda na água. Pensou ela que coisa era aquela..., poderia talvez ser algum objeto que lhe favoreceria vender.

 

Mas para seu desespero aquilo que ela pensava ser um objeto, era na verdade uma criança sem vida.

 

Ao ver tal cena, dona Geraldina esqueceu o frio que estava, o vento forte que fazia e entrou em desespero ao ver aquele corpo pequeno, extremamente inchado e roxo.

 

Tomada pela tristeza e pânico ao mesmo tempo, mal acreditava no que seus olhos viam, ao longe avistava mais volumes como aqueles...

 

Saiu correndo em direção ao outro algo volumoso, se calcula que estavam na distância de 1 km entre uma e outra, dona Geraldina não queria acreditar ser outro corpo.

 

Mas infelizmente se tratava de outra criança, que por sinal era maior que a primeira, ambos parecidos.

 

A mulher passa a pensar em várias coisas, algo que fosse organizado propositalmente, os corpos em mesma posição e com distâncias entre um e outro praticamente iguais, ou talvez, alguma embarcação houvesse virado.

 

Chegavam alguns outros moradores locais que também recolhiam objetos, alguns pescadores que pela direção oposta que estava dona Geraldina, encontravam mais corpos, todos em posições iguais, inchados enrijecidos e com a pele rocha.

 

Em pouco tempo aglomerou vários moradores que mal acreditam no que viam se somaram 5 crianças, sendo duas delas meninas.

 

Em praticamente 1 km de distância entre uma e outra, elas se encontravam entre a praia Stela Maris e Ipitanga.

 

Não demorou muito para que a polícia de Lauro de Freitas chegasse ao local, mas ao se depararem com tal cena chamaram reforços e retiraram os corpos do local evitando que jornalistas tirassem fotografias.

 

Os corpos foram enviados aos IML Nina Rodrigues. Os legistas foram Evandro Ferraz de Melo e Evandro Costa e Silva. Verificaram que apenas duas crianças estavam vestidas:

 

a menina, que aparen­tava ter quatro anos, vestia uma calcinha de algodão rosa, e o menino, que parecia ter pouco mais do que seis meses, usava uma camiseta.

 

Os outros três estavam nus. todos os corpos continham grande quantidade de água e areia no estômago, bem como já estavam em estado de decomposição, rígidos e esverdeados.

 

O que concluíram que as crianças haviam falecido entre meio dia a meio noite, não foram abusadas e eram bem nutridas e saudáveis. Morreram afogadas.

 

Os corpos foram embalsamados, até que alguém fosse fazer o reconhecimento dos corpos.

 

O laudo foi entregue à delegacia da Boca do Rio, que assumiria o caso, já que o posto policial de Lauro de Freitas não tinha condições de investigar todos os pormenores da história, que parecia ser muito maior do que o delegado Edson Pereira das Neves su­punha.

 

Para ele as crianças teriam morrido afogadas após caírem de uma embarcação onde deveriam estar junto com os pais. Como a maré estava muito brava em Ipitanga, o pequeno barco poderia ter virado, e os corpos dos pais ainda não haviam subido até a superfície.

 

Mas era apenas uma questão de tempo ou de maré de enchente até que eles aparecessem.

 

Dia 2 de maio, na segunda feira vários comentários em torno caso saiam no Jornal da Bahia, Diário de Notícias e Jornal A Tarde.

 

Tratando o caso como o mistério da morte dos 5 irmãos, assim era o que se pensava pela imprensa e populares. Inclusive o próprio delegado a muito.

 

A princípio toda população acreditava em afogamento, onde provavelmente alguma pequena embarcação havia virado.

 

As vezes surgia um corpo na praia vítima de afogamento, devido a ressaca da maré, porém ocorria raramente. Naquele caso, era chocante! Toda uma família.

 

Por fim, quem assumiu o caso investigado foi o delegado Antônio Medrado, aos 39 anos, era diretor da D.C.P, a Di­visão de Polícia da Capital.

 

Por solicitação dos superiores em segurança no estado, passaria a comandar as investigações.

 

O delegado pensava que alguma coisa não se encaixava naquela história. Se fosse um passeio em que crianças tivessem saído com os pais e eles também tivessem se afoga­do, os corpos já deveriam ter aparecido.

 

Um dia inteiro havia se passado desde que os corpos foram encontrados e ninguém havia aparecido se dizendo pai das crianças. Medrado começou a levantar a hipótese de as­sassinato.

 

Sim, os pais poderiam ter cometido o crime contra os próprios filhos. Seria algo bárbaro, mas ele já tinha experiência suficiente para deduzir que aquilo não era impossível.

 

A imprensa pressionava o delegado para saber de informações sobre o caso, ele geralmente falava pouco, já que não tinha ainda uma linha investigativa.

 

Demarcou áreas dos corpos encontrados e possíveis locais de onde poderiam ter surgido os corpos, trazidos pela corrente marítima.

 

Prestou várias entrevistas a vários jornais e rádios, alegava não acreditar que as crianças fugiram dos pais e acabaram se afogando, porque ninguém procurava os corpos, e caso estivessem em barcos com a família, não apareceu nenhum outro corpo sem ser de crianças.

 

Enquanto isso grupos policiais buscavam informações e os pais das crianças, indo bairro por bairro da região... Falando com as famílias se alguém tinha alguma informação...

 

Foi quando através das páginas de jornal da Bahia que saiu dia 2 de maio que o fazendeiro no povoado de Barra, do município de Mundo Novo, local que fica a 300 km de Salvador.

 

O senhor Valdomiro Brandão, conhecido como Vavá, proprietário de da Fazenda teve conhecimento da morte das cinco crianças.

 

Procurou a polícia para contar que um grupo de empregados que ele tinha, abandonaram a fazenda para seguir um casal de pastores que se dizia enviado por Deus.

 

Eram mais de 20 pessoas, sem contar as crianças, que teriam se mudado do povoado de Barra para viver em Salvador ha­via cerca de dois meses.

 

Mas que ficou preocupado com o ocorrido, contou todas as coisas que ocorriam, a fervura da fé do grupo, e que um dos empregados que fugiu havia retornado a fazenda.

 

José Alves, 17 anos e contou ao patrão seu Vavá que o grupo estaria vivendo em uma tenda no meio de areia, que ficava próxima ao mar.

 

Ele fugiu do grupo retornando a fazenda, sob o argumento de que em cima da tenda passavam muitas abelhas tontas e aquilo o deixava desesperado.

 

Os policiais acreditaram que as tias abelhas barulhentas seriam as aeronaves que decolavam do aeroporto de Salvador.

 

O terminal aéreo da capital baiana ficava relativamente próximo do local onde os corpos das cinco crianças haviam sido encontrados.

 

Seu Vavá ainda contou, que o guri ouviu o tal pastor dizer que jogaria os filhos desobedientes dos trabalhadores no mar para os Tubarões os comecem.

 

O delegado pediu que o fazendeiro fosse até o IML tentar reconhecer algumas das crianças mortas e ele aceita.

 

Algumas horas depois o fazendeiro deixava o IML totalmente abatido. Seu Vavá reconheceu uma das crianças como sendo filha de uma ex-empregada da fazenda. O homem retorna a sua residência.

 

Dia 3 de maio os policiais vão até a fazenda do seu Vavá para investigar o local onde moravam e se alguém sabia de algo que pudesse ajudar na investigação.

 

Quando ainda a noitinha do dia 3 a viatura policial busca o guri José Alves para leva-los até o local onde se encontrava o grupo no areal.

 

Enquanto isso ocorria, o pescador Clarindo, conhecido por todos como Nelinho estava na praia próxima onde foi encontrada as cinco crianças e acaba vendo uma sexta vítima boiando naquelas águas.

 

Percebeu que outros dois cadáveres haviam sido tragados pela água, para então desaparecer.

 

Conseguiu resgatar o corpo que era de uma menina. Experiente pescador sabia que pela movimentação das águas, não demoraria, para que os outros dois fossem aparecer em outro lugar da praia.

 

Ele por sua vez chama a polícia, que envia o corpo para o IML.

 

Por outro, lado os policiais em conjunto com José Alves o guri de 17 anos seguiam com as buscas pelo grupo, porém era noite e em meio a areia e algumas vegetações era impossível dar continuidade.

 

O que fez com encerrassem aquele dia e dessem início nas buscas na manhã seguinte.

 

Dia 4 de Maio, quarta-feira, seis da manhã o pes­cador que havia encontrado o corpo da menina no dia anterior seu Clarindo do Nascimento o Nelinho não esquecia tal cena.

 

Saiu de casa no bairro de Nova Brasília e tentar encontrar aqueles dois corpos em um local conhecido como Porto das Jangadas, na praia de Stella Maris.

 

O pescador jogou a tarrafa em um lugar próximo às pedras. Acompanhado de seu cachorro que correu para perto de outro cão que estava próximo à estrada.

 

O cachorro desconhecido arrastava alguma coisa que parecia pesado do meio do mato. O cachorro dele começou a puxar a tal coisa junto com o outro animal.

 

Seu Clarindo foi verificar e percebeu que a maré havia cavado um buraco na areia durante a madrugada.

 

Ali estava uma pequena ca­beça ligada ao tronco, um braço parcialmente destroçado mostrava parte do osso que despontava do pequenino ombro.

 

Os dedos estavam parcialmente em osso, no lugar onde deveriam estar os olhos, haviam dois grandes buracos escavados aparecendo somente restos de tecidos.

 

Clarindo enxotou os cães, que a essa altura já traziam à boca pedaços da carne amolecida. Pegou um caixote que se colocam frutas na feira que estava na areia. E ali colocou os restos mortais.

 

Foi quando um outro pescador chamado Pedro Nascimento, conhecido por Piroca, chamou: Nelinho! Nelinho! Estavam em uma distância de 300 metros um do outro. Seu Nelinho não entendia o que o amigo dizia.

 

Na verdade, seu Pedro o Piroca ha­via encontrado o que sobrara de outro corpo: uma cabeça.

 

De bicicleta, seu Nelinho foi até o posto policial de Itapuã, onde encontrou o chefe da equipe de plantão, Alan Gomes.

 

Contou que já havia visto aqueles restos boiando próximo ao corpo que encontrou no dia anterior.

 

 

Enquanto isso debaixo da tenda do grupo religioso as coisas não andavam bem. Godofredo o antigo gerente da fazenda que largou tudo para seguir o pastor.

 

Discutia ferozmente com o mesmo. Alegando a Matota que sairia do grupo, pois as coisas estavam ocorrendo de forma errada.

 

Os policiais por sua vez revistavam os bairros como Nova Brasília, onde a população estarrecida com os militares, nunca havia os visto na região.

 

Bem como, nunca haviam aquelas crianças que os policiais mostravam fotos, procurando casa por casa a procura de familiares.  

 

Os populares pensavam ser inútil tal busca pelos pais, todos acreditavam que os pais deveriam também estarem mortos já que uma família havia morrido afogada.

 

Bastava aguardar o corpo dos pais na areia da praia. Isso porque os o delegado não informou a imprensa da existência do tal grupo de fanáticos. E que possivelmente se tratava de um crime.  

 

Junto com José Alves andaram por horas em meio a região praticamente deserta. Mas pelas 10:00 da manhã perceberam uma pequena movimentação no meio da densa mata que cobria os montes.

 

Era possível ouvir o barulho do mar da praia de Ipitanga.

 

Os policiais chegaram mais perto e viram um plástico que forrava uma pequena e malfeita tenda. Cerca de 20 pessoas pareciam estar envolvidas por uma espécie de transe.

 

Os po­liciais observaram do alto a movimentação confusa do grupo, que estava em uma parte mais baixa de um areal.

 

Todos sujos e maltrapilho. Alguns estavam em silêncio, sentados de forma desordenada, faziam pequenos rabiscos na areia. Apresentava comportamentos estranhos.

 

Outros cantavam baixi­nho, como se suas vozes repetissem trechos confusos de hinos religiosos.

 

Pareciam que todos estavam fora de sí, loucos, parecendo um grupo de lunáticos.

 

A descrição dada por José Alves que até então parecia incrédula a tal história, era um retrato fiel da descrição dita por ele.  

 

Como se tratava de muitas pessoas, o chefe da equipe decidiu pedir reforços de outro grupo que fazia buscas em uma região perto dali.

 

Enquanto aguardavam a chegada da outra equipe, os policiais foram percebidos pelo grupo, que passou a observá-los da parte mais baixa do morro.

 

Pareciam não entender a presença daqueles homens far­dados ou, se entenderam, não tomaram atitude nem formularam qual­quer estratégia para escapar dali.

 

Não houve resistência quando os dez homens de arma anun­ciaram aos gritos que todos seriam presos acusados da morte das cinco crianças.

 

Nessa hora Godofredo agradeceu por ser preso e ter como sair da jaula que a religião que impunha e na furada que entrou.

 

O policial João Fernandes da Silva se aproximou de um homem moreno, 29 anos a quem os outros membros do grupo tratavam com uma espécie de temor e reverência.

 

Que por sua vez, segurava em seu colo uma criança, que era seu filho Morotó. Já presumiu que ele era o tal, era o pastor Matota.

 

Ao seu lado a um pouco mais atrás estava Marata, 22 anos, cabelos castanhos, sujos e arrevirados pelo vento, rosto e ombros bastante queimados da maresia.

 

E foi assim que o policial Fernandes inicia o interrogatório de Matota, responsável pelo grupo. Logo perguntou-lhe: porque aquele bebê que segurava no colo não teve o mesmo fim como as demais crianças?

 

O pastor respondeu que aquela que ele segurava não estava com o diabo no corpo e sim um santo. Ou seja, o bendito Jesus estava em seus braços.

 

A criança prometida que era menina e ele insistia em dizer que era um menino castrado por Deus enquanto ainda estava na barriga da mãe.

 

E que o grupo não fez nada de errado, apenas obedeciam as ordens de Deus, por isso, os próprios pais foi quem jogaram os filhos no mar.

 

Eram crianças possuídas pelo demônio, mesmo criança eram diabólicas.

 

Foi assim que já algemaram Matota e Marata os colocando na viatura. Os demais do grupo, assim que foram abordados e colocados nos carros policiais não tiveram reação alguma.

 

Achado o grupo o serviço ainda continuava na praia, por volta das 14h10 da tarde, chegou o perito Franco-suiço e famoso que re­alizaria a perícia nos corpos.

 

Para o legista aqueles restos de carne amolecida não eram das duas crianças que ainda estavam por ser encon­tradas.

 

Segundo ele os corpos não eram de crianças, as arcadas dentárias possuem dentes profundamente cariados, cáries bastante antigas. Que não havia possibilidade de terem sido sacrificadas.

 

Enquanto isso na Praça da Piedade em Salvador de longe se ouvia as sirenes das viaturas policiais, que chegaram em comboio estacionando em frente ao prédio da Secretaria de Segurança Pública.

 

O grupo chegou algemados, conduzido pelos soldados que haviam realizado a prisão ainda nas dunas.

 

Estavam mal vestidos, descalços, e as roupas sujas ainda estavam úmidas da maresia. Funcionários, policiais, todos correram para ver de perto os 21 membros da seita que haviam assassinado os próprios filhos.

 

Repórteres e fotógrafos, além de uma centena de curiosos, formavam um aglomerado em busca de um lugar mais à frente na sala da assessoria de imprensa, onde seria apresentado o grupo.

 

Marata 22 anos mantinha a cabeça baixa, a mão tentando esconder os olhos, e chorava. Matota, 29 anos ao contrário da esposa, nem uma só lágrima, qualquer indício de arrependimento.

 

Quando o delegado lhe pergunta se tem algum pedido a fazer, antes de ser mandado de volta à cela, ele respondeu com voz seca, ríspida:

‘Queria falar um tempinho com minha mulher. Os dois sozinhos’.

 

Outros membros do grupo foram sendo introduzidos, um a um, na pequena sala do casarão da Piedade.

 

O primeiro deles é o velho José Catarino de S. de 68 anos. Durante 44 anos, ele trabalhou na Fazenda Havana, no município de Mundo Novo.

 

Seu codinome na seita era Jacó, e sua oferenda aos estranhos deuses do Ma­tota, no sacrifício coletivo na noite do dia 30 de abril, na praia de Ipitanga, foi uma netinha de três anos.

 

Em depoimento, membros do grupo afirmaram que oito crianças haviam sido sacrificadas, o que, portanto, apontava para outros dois cor­pos que continuavam desaparecidos, ou seja, as duas crianças encontradas pelos pescadores e que o legista disse que não eram.

 

 As crianças, de 8 e 2 anos, eram co­nhecidas como José Carlos codinome Obede e Núbia, apelidada de Miriam pela seita.

 

Saíram da pequena sala e foram conduzidos direto para as celas locali­zadas em uma parte do prédio da secretaria. Outros três rapazes foram transferidos para o Juizado de Menores.

 

O casal havia parado de se ali­mentar. Se faziam jejum para conversar com Deus, como afirmavam que podiam, ou greve de fome para sensibilizar os policiais e a imprensa.  

 

Matota disse ao delegado Medrado: Somente aqueles que vivem sem Deus têm que comer. Eu posso levar 30 dias sem me alimentar.

 

No dia 5 de maio o diretor da Polícia Técnica, José Raimundo Sales de Oliveira, muito respeitosamente comentou o equívoco do médico legista franco-suíço.

 

Os dois corpos encontrados eram mesmo das duas crianças que faltavam da lista das oito sacrificadas pelos membros da seita na praia:

 

Núbia de 2 anos, e o meio irmão José Carlos de 8 anos, ou simplesmente Miriam e Obede, como eram chamados pelo grupo.

 

O delegado passou a interrogar os adultos, os poucos que falavam contavam as mesmas coisas que José Alves havia relatado.

 

Os pais que perderam os filhos tinham ações diferentes, uns se sentiam envergonhados, outros choravam até soluçar quando viam as fotos das crianças do IML.

 

Alguns pareciam estar em transe e mal respondiam as perguntas do delegado. Tudo era muito confuso na cabeça do grupo.

 

Nesse mesmo dia 5 o motorista Francisco Sales Lima que havia encontrado a menina Rosimere de 9 anos se apresentou ao delegado Medrado. E contou-lhe como encontrou a menina.

 

Assim só tinha uma forma de saber se a menina faia parte do grupo, mostrando ela a própria mãe. Que ocorreu o encontro mais tarde ainda naquele mesmo dia.

 

As 19:00 o grupo que é conduzido por policiais para o IML.

 

A chegada deles foi super complicada. Era uma multidão querendo agredi-los. Matota era chamado de Monstro e questionado por que não matou seus próprios filhos? E ele respondia: Perdoai-lhes, senhor.

 

Eram homens e mulheres algemados que fariam o reconhecimento dos corpos das crian­ças, filhos seus. Os corpos estavam em cima de uma bancada de azulejo amarelo.

 

Estavam organizados do menor para o maior Samuel, Suani, Marta, Ma­rivaldo e Miriam. Traziam as marcas da necropsia recente, cicatrizes sobressalentes tornavam os cor­pos com aspecto ainda pior.

 

Armados de pedaços de paus e pedras, a multidão aguardava a saída dos membros do prédio.

 

Também crescia o número de curiosos que ficavam sabendo naquele momento o motivo de tamanha algazarra e se juntavam ao grupo.

 

Para garantir a segurança dos presos, os policiais assustados solicitaram por rádio a presença de homens do Comando de Policiamen­to Militar que chegaram em grande número.

 

Ao sair do necrotério Matota disse: – Acho que Deus vai me chamar! Aquele homem que mandava em tudo já era, agora estava sem comer se dando um de coitado! 

 

Alguns acreditavam que era porque estava sem Marata e ela é quem dava as ordens. E que na verdade a esposa é quem era a cabeça de toda aquela bábarie.

 

Assim que os membros iam sendo ouvidos, a culpa pelos crimes caia como um fardo pesado nos ombros do casal de pastores.

 

Os fanáticos confirmaram a participação nos crimes, mas alegaram que colocaram a confiança em Matota e Marata pela fé e que chegaram até ali através deles.  

 

No depoimento de Matota ficava claro o papel que desem­penhara na matança. Todos saberiam que um dia o sacrifício ocorreria, pois Deus revelaria a ele e todo o grupo concordou.

 

Ainda falava com certa desenvoltura sobre tudo o que o delegado perguntava.

 

Não colocava a culpa em Deus, mas que guiou todos até ali para salva-los da punição e dos castigos que seriam colocados àqueles que não acreditassem.

 

As próprias crianças haviam sido sacrificadas porque haviam cedido espaço em suas almas para a presença do diabo, explicava sem nenhum arrependimento, como se tivesse feito um favor pro mundo.

 

Segundo o tal pastor Matota:

 


Não havia inocência nenhuma naquelas crianças, apenas os corpos eram infantis e foram prova do castigo que todos seriam vítimas.

 

Delegado colocou o grupo frente a frente, Matota ao lado de Godofredo que não conteve as lágrimas. Disse que a esposa entregou a filha deles para o sacrifício.

 

Após o ocorrido ele ficou com remorso, mas o pastor dizia que quem tivesse remorso seria castigado.  de voltar ao acampamento. Godô por sua vez deixa claro seu arrependimento de ter seguido o tal pastor.

 

A esposa de Godô Maria da Paz era a mãe mais abalada havia perdido dois filhos no sacrifício Rubia fruto da relação com o marido e o filho mais velho José Carlos.

 

E claro a filha que ela abandonou.

 

E essa é colocada a sua frente junta a uma psicóloga, mãe se desespera ao encontrar a filha e chora pela primeira vez desde que foi presa. A menina arrumada de vestido e tranças no cabelo, muito bem cuidada chorava por seus motivos.

 

A mulher contou que viviam no mato, foram seduzidas pelas pregações do pastor que depois espancava e castigava as crianças que até passavam fome.

 

Os adultos também passavam por situações de prova quando eram obrigados a fica embaixo de chuva porque o pastor dizia que a chuva era Deus.

 

6 de maio de 1977 Matota dividia a cela da prisão com Manoel José Sales da Silva, 25 anos, apelidado como Churrasco Cumpria pena por dois assassinatos cometidos em São Paulo e um ter­ceiro em Salvador, havia cerca de dois meses.

 

 

Churrasco foi intermediador entre os repórteres que se amon­toavam em dezenas de pedidos de entrevista a Matota. O jornalista do Diário de Notícias tinha ido entrevistar Matota, mas o mesmo não queria falar.

 

Churrasco disse ao repórter que o companheiro de cela não dormiu a noite toda. E só choravam, mas que o aconselhou a comer e dormir se não ficaria louco.

 

Churrasco falou que deve ser duro mesmo o remorso por matar crianças inocentes. Que ele já havia matado três e não se arrependeu porque todos eram adultos. Mas criança é diferente.

 

Alegou ser Testemunha de Jeová, mas assaltava, fumava e bebia. Quando saísse da prisão iria continuar matando e bagunçando.

 

Não queria ficar ouvindo conversa fiada de gente que diz ver e falar com Deus e andar por aí matando crianças.

 

Outros presos de cela vizinha gritava: Ele que se cuide. Tudo isso abaixo de gritaria, inúmeras palavras de ódio ditas pelos presidiários.

 

Faziam com que Matota ficasse o tempo todo em um canto da cela oposto a Churrasco. Como um bicho acuado por outros maiores.

 

Reclamou com o delegado e excesso de perguntas feitas a ele e desde o dia em que foram presos, só teria conversado uma vez com Deus. Não se sentia abandonado.

 

O velho Jacó, como chamavam o senhor José Catari­no. Desde que havia sido preso, se queixava de dor, passou a se contorcer, num sofrimento calado, levaram-no ao médico e descobriram que era colite nervosa.

 

Inflamações do intestino quando não tratadas levavam a morte. Seu José Catarino não havia participado diretamente da matança. Havia sido um infeliz espectador dos crimes.

 

Nem ele entendia sendo um senhor de idade se metido em meio aquela gente junto com 7 filhos. Perdeu dois netos.

 

Naquela tarde, Matota aproveitou a presença dos jornalistas e fez uma denúncia. Alegou ter medo de morrer e que apanhou dos policiais. Inclusive de Churrasco.  

 

Tudo isso estampou as páginas dos jornais, a polícia o encaminhou para o IML para verificar a veracidade da denúncia.

 

Enquanto a mídia e populares estavam distraídos com todo esse ocorrido...

 

Por volta das 15 horas, rabecão . As crianças tiveram o funeral pago pela Secretaria de Segurança Pública, sem muito custo.

 

Por volta das 15 horas da sexta-feira, o rabecão do Nina Ro­drigues estacionou no cemitério. Foram sete caixões de madeira simples, sem verniz ou veludo, sem alças douradas, nem coroas de flo­res naturais e nem em flores de plástico.

 

Nada! TUDO EM BRANCO.

 


As covas eram rasas, as cruzes improvisadas em madeira branca esta­vam inscritos os nomes e as datas de nascimento e morte pintadas com tinta negra.

 

Enfileirados no chão de terra, ao lado das crateras abertas, os caixões traziam em cima de cada um o nome da criança.

 

Os caixões foram sendo baixados um a um.

1º Sérgio Alves de Araújo, cova 342.

2º Cloude de Jesus, cova 343.

3º Andréa Bispo dos Santos, cova 344.

4º Samuel Bispo dos Santos Souza, cova 345.

5º Márcia Santos Souza, cova 346

 

Em caixões meno­res, foram depositados os restos de:

José Carlos na cova 358

Núbia, cova 357.

 

Pelas contas de um repórter faltava um caixão com o corpo de Marival­do Alves de Araújo cujo nome não foi chamado naquela lista. Porém um dos coveiros disse que um sepultamento já havia sido realizado na segunda-feira.

 

Fato compro­vado na checagem da inscrição na cruz a poucos metros de onde foram enterrados os 7 corpos. O sepultamento não durou mais do que 15 minutos. E na hora desabou uma tempestade.

 

No dia seguinte 7 de Maio, dia seguinte da entrevista e todo bafafá que deu por conta da declaração de Matota ser agredido. Saiu o laudo feito pelos legistas.

 

Que por sua vez alegavam que Matota não havia sido espancado, pois não apresentava nenhum hematoma e nenhum arranhão.

 

O delegado Antonio Medrado Alcântara foi chamado diretamente pelo secretário Luís Arthur de Carvalho, assim que os jornais ganharam as bancas.

 

Ele ordenou que fossem suspensas as entrevistas com o preso Matota e determinou que o mesmo fosse transferido para outro xadrez e mantido em absoluta inco­municabilidade.

 

O pastor apresentava fala arrastada e o corpo maltrapilho, dava impressão ao delegado de que o pastor havia mergulhado no abismo sombrio do arrependimento.

 

Churrasco também foi prejudicado. Como punição, foi transferido de penitenciária. Dividindo a cela com estupradores e outros assassinos no Reformatório Penal Agrícola de Pedra Preta.

 

Que mais tarde ficou conhecido com o nome de Colônia Lafayete Coutinho.

 

Enquanto isso Marata, que estava confina­da na Polícia Feminina. Falava com firmeza nos depoimentos que prestava ao delegado e as entrevistas.

 

Nunca chorou, nenhuma lágrima saia daquele olho nem mesmo quando mostravam as fotos das crianças sacrificadas.

 

Segundo ela não se arrependia nem tinha remorsos, fez porque tudo foi feito de acordo à vontade de Deus.

 

Ainda alegou que estava em Salvador a mais de um mês quando Deus ordenou para que ela e o marido sacrificasse os desobedientes.

 

Ali não eram crianças se tratavam na verdade de Caim Beleial. – Referência de diabo para ela.  

 

O irmão de Marata chamado Ataíde Passos dia 8 de maio disse a imprensa que iria a Salvador para ir ao Juizado de Menores buscar a sobrinha.

 

Os avôs da criança sofriam com a ausência da pequena.

 

Contou a uma equipe de reportagem do Jornal A Tarde que foi até o povoado de Barra, conversaram e fotografaram a mãe de Marata.

 

Dona Isabel Pessoa, apesar dos 45 anos de idade, parecia muito mais velha. O corpo era exageradamente magro, que fez o repórter pensar se tratar de uma figura desnutrida.

 

Alegou aos repórteres que a filha estava dominada pelo marido. Nem ouvia mais os conselhos da mãe. Até mesmo Morotó era dei­xado de lado. Nilza só tinha olhos para José Maurino.

 

Seu Fidélis interrompeu a voz chorosa da mulher. Falou que a filha era educada, que só pensava em ser professora. Daí apareceu o Satanás e transformou a cabeça da pobrezinha.

 

Dia 11 de Maio é feito uma avaliação de sanidade mental no grupo. Pedro, que pela Universal Assembléia dos San­tos era chamado de Fanuel, dizia que via tudo, mas estava sem reação para nada.

 

Contou tudo o que ocorreu sob seu ponto de vista.

 

Era um dos homens de maior confiança de Matota. Talvez por estar sem­pre junto ao pastor, vivia um conflito de sentimentos, dizia que não sentia remorso nenhum.

 

E que se Matota mandasse o pessoal se jogar no mar, tinha ido todo mundo. Segundo ele o grupo estava em transe e a esposa não havia aceitado tão bem a decisão do sacrifício.

 

Conforme ocorria as avaliações os detalhes eram revelados, assim como a participação exata de cada um no sacrifício.

 

E mesmo com o depoimento de todos afirmando que não havia outros envolvidos, o delegado Medrado coordenou uma varredura no local al­guns dias depois. O acampamento foi mais uma vez revistado.

 

As barracas foram destruídas e queimadas.

 

Passado a metade do mês de maio daquele mesmo ano 1977...

 

O senhor José Catarino, 68 anos, e a esposa Almerinda, 40 anos. Não sofreram nenhuma condenação, na justificativa de que apenas participavam como testemunha dos sacrifícios.

 

Foram enviados a Barra de Novo Mundo e voltaram para o convívio com os sete filhos.

 

Lourisvalda, de 19 anos, gravida de oito meses do marido Dario L. de Jesus, chamado de Daniel, que tiveram os 3 filhos afogados. Foram enviados a terra natal, seguindo em liberdade.

 

Romildes, 20 anos, esposa de Pedro estava grávida. Ambos tiveram 2 filhos afogados, foi enviada também a Barra do Novo Mundo. Livre, marido e esposa pois a justiça alegava que não havia o que fazer com eles.

 

Bem como, alguns outros integrantes do grupo. Alegavam que os dois homens que ajudaram a empurrar a ultima vítima e os pais que entregavam seus filhos aos sacrifícios agiam como robôs, comandados por Matota e Marata.

 

Os ânimos em Mundo Novo, se exaltaram, era o único assunto na cidade. Seu Vavá havia se comprometido em aceitar de volta os trabalhadores, assim como já havia feito com o guri José.

 

Os ex participantes do grupo religioso tentavam reestabelecer seus vínculos na comunidade e em meio familiar.

 

Passados 3 meses, dia 22 de agosto, ambos foram encaminhados à Casa de Detenção no dia 22 de agosto de 1977.

 

Bem como, nessa mesma data a Justiça entendeu que os cinco das pessoas que tinham sido liberadas, haviam participado ativamente das mortes das oito crianças na noite do sacrifício. Portanto nessa data de 22 de agosto.

 

Saiu também o mandado de prisão preventiva de cinco participantes que anteriormente foram liberados, sendo eles: Dario de Jesus - Daniel, Pedro dos Santos - Fanuel, Godofredo - Josué, Janilton - Arão, Floraci - Ana.

 

Godofredo acabou fugindo e não foi encontrado.

 

Portanto, quatro deles foram conduzidos até a Casa de Detenção no dia 9 de agosto durante um mês.

 

Depois foram transferidos e confinados no manicômio Judiciário, onde permaneceram por um ano e meio à espera dos resultados dos laudos médicos que concluíram a ação penal.

 

Dia 23 de setembro de 1977 Matota e Marata também saíram da penitenciária e enviados para o Manicômio Judiciário onde aguardariam por julgamento.

 

Cerca de nove meses depois da prisão do grupo no Manicômio Judiciário, na tarde de 4 de julho de 1978, Floraci -  Ana, morre no Hospital Getúlio Vargas, em Salvador, vítima de uma broncopneumonia.

 

30 de novembro de 1978. Os pareceres médicos da psiquiatria alegavam que eles não eram culpados, não eram loucos, nem criminosos. Mas que a própria situação de miséria os levou a seguir o pastor e acreditar em tudo que o homem dizia.

 

Sem perspectiva, sem instrução, estavam todos enfraquecidos diante do carisma do líder Matota.

 

Ou seja, problemas socioeconômicos e submissão. E incapazes de entender o ocorrido como ato criminoso. Tiveram liberdade, por serem vistos como vítimas.

 


A conclusão sobre a saúde mental do casal Matota e Marata foram tratados por doença mental. Permaneceram no manicômio entre 1977 a 1985, permaneceram em alas diferentes..

 

Apenas se viam em ocasiões especiais com liberação da direção do Manicômio. Matota se sentia solitário, ele não conversava com nenhum dos outros internos.

 

Não participava das atividades oferecidas pela instituição. Ficava deitado no pátio, sempre isolado dos demais. Desempenhava trabalho na tecelagem, depois no refeitório.

 

Esquecia algumas coisas, como idade dos irmãos, sobrenome dos pais. Nas consultas com o psiquiatra evitava descrever a cena em detalhes dos sacrifícios.  Perdeu o tom de autoridade. Tinha muitos pesadelos a noite, Continuava ouvindo vozes, sentia vontade de chorar.

 

Chorava muito inclusive de soluçar, pois não entendia o que aconteceu, pois ele não era capaz de fazer mal para uma mosca. Mas compreendia que precisava pagar pelo que fez.

 

Sonhava em sair do manicômio e trabalhar, mas continuar frequentando a igreja, queria ter uma vida normal.

 

Marata chegou a se ocupar como ajudante do dentista que atendia aos internos. Mas não durou muito tempo... ela apresentava mudança de humor brusco e muito nervosa.

 

Sempre que falava com as pessoas mantinha os olhos retos, não apresentava medo.  Apresentava frequentes de dores de cabeça e pequenos tremores. Quando era questionada sobre a seita ela tinha choros compulsivos que nem se entendia o que ela falava.

 

Mas o psiquiatra percebia que os choros dela não eram verdadeiros. Isso porque ela tinha muita força na fé. Ou seja, não pensaria duas vezes em cumprir a uma nova ordem de Deus.

 

Nunca ocorreu o julgamento do casal Matota e Marata. Foram considerados portadores de doenças mentais. não poderiam ser considerados responsáveis pelos próprios atos. Não deveriam ser punidos, mas sim, tratados.

 


 Dia 12 de setembro de 1985 receberam a liberdade que deveria ser vigiada pelo período de 1 ano. Ambos cruzaram o portão do manicômio juntos. Onde deveriam informar ao judiciário, onde viviam e quanto ganhavam. Bem como não poderiam beber, nem ficar perto de bares, estar em casa cedo e para se mudar deveriam comunicar.

 

A mãe de Marata, informava que “receberia Maria Nilza com muito carinho”.

 

A família de Matota ainda vivia em Santo Antônio de Jesus e, durante alguns feriados, ele chegara a ir visitar os pais.

 

Não se sabe do que ocorreu com o casal depois da liberdade e nem sobre o paradeiro do grupo.

 

Segundo o próprio psiquiatra não havia nada de loucura. Tudo não passava de uma crença religiosa. O que se percebe em Matota atualmente é perceptível ver em outras personalidades religiosas.

 

O próprio psiquiatra do casal Dr. Hamilton Meira, resolveu entender um pouco melhor o que aconteceu, passou a ler inúmeros livros sobre fanatismo religioso. Depois foi em todas as congregações que Matota frequentou.

 

O psiquiatra foi até Barra de Mundo Novo, frequentou a Igreja Assembleia de Deus, depois Igreja Universal do Reino de Deus, no Aquidabã, posteriormente na Deus é Amor, no bairro das Sete Portas, por fim concluiu:

 

 Matota sempre foi um indivíduo muito esperto. Vendia aquelas telas para colocar na frente da televisão para dizer que era colorida.

 

O pastor só assumiu os dons quando começou a perceber a perspectiva religiosa dos pentecostais. Que Talvez antes não tivesse percebido o quanto era significativo aquela coisa dos dons do espírito santo.

 

E aquilo veio naturalmente com a liderança que ele passou a ter, que foi muito rápida.

 

E por fim quem poderia ter algum tipo de problema mental seria Maria Nilza.

 

Conclusão: E disso tudo o que fica é quantas vezes acabamos seguindo ou acreditando em pessoas que de certa forma se destacam em um grupo, ou região?

 

Grande parte das vezes somos seduzidos por falsas promessas e no momento de fraqueza, desestabilidade emocional ou até financeira acabamos entrando facilmente em uma seita.

 

Muitas são as seitas, não só religiosas, mas também políticas, grupos que defendem uma teoria ou até um tipo de filosofia. Geralmente esses líderes são acolhedores, falam muito bem, defendem suas ideias com convicção.

 

Apesar do caso Marota e Marata ser antigo ele é uma realidade muito atual. São inúmeras pessoas que doam para um grupo o que mal tem condições, na promessa de ter o dobro.

 

A palavra de Deus tem muito peso. E não demora muito para convencer.

Por isso, são tantas igrejas lotadas e lideradas por sacerdotes que tiveram o poder da fala e pouca vontade de trabalhar.

 


Na minha opinião quanto ao caso de Marota e Marata é que tudo começou pela preguiça do Matota de trabalhar, ver na igreja a oportunidade de falar de Deus do que pegar na enxada.

 

Referências:

Livro: MATOTA E MARATA - CAVALEIROS DA FÉ.



 

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