ILHA GRANDE – O CADEIRÃO DO DIABO

ILHA GRANDE – O CADEIRÃO DO DIABO 


FIZEMOS UM VÍDEO SOBRE O CASO EM NOSSO CANAL DO YOU TUBE: 



Antes do descobrimento do Brasil em 1400 a região era habitada por Tamoios, índios perigosos e valentes. Eram grandes flecheiros, caçadores, pescadores de linha e mergulhadores.

 

Viviam de modo diferente dos outros indígenas, suas aldeias eram fortificadas com estacas que chamavam "caiçaras" e composta de cinco ou seis ocas, abrigavam cerca de 150 a 200 pessoas no seu total.

 

Sua língua era diferente das que eram faladas pelos índios dos arredores.

 

Foram os Tamoios que batizaram o nome da ilha de Ipaum Guaçu (Ipaum significando ilha e Guaçu, grande). Por isso, o nome de ilha Grande.

 

Até que em 1502 o navegador Gonçalo Coelho descobre a Ilha Grande junto à baía de Angra dos Reis. Período que ocorria uma guerra entre índios Guaianases e Tamoios, que disputam as áreas favoráveis à pesca na ilha.

 

O local tão disputado, foi motivo de guerra entre portugueses, franceses e os próprios índios Tamoios em 1554.

 

Mas em 1559, Don Vicente da Fonseca foi designado pelo Reino de Portugal para tomar à posse de Ilha Grande e administrar o primeiro núcleo colonizador, em uma fazenda.

 

Era também em Ilha Grande que ocorria ponto de vendas de escravos. E onde Francisco Palheta plantou o primeiro pé de café.

 

Após anos, em 1617 a Ilha Grande sofreu também inúmeros ataques feitos por piratas. Eram tantos os ataques e abusos acontecendo no trecho entre Cabo Frio até Santa Catarina.

 

Que o Rei Felipe II da Espanha resolveu manter uma guarda costeira para a região. Mantendo no local um pirata protegido por ele chamado Juan Lorenzo, em 1629.

 

Perto da praia Juan construiu uma casa-refúgio que ele batizou de Morcego. É considerada a terceira construção de alvenaria do país.

 


No ano de 1725 com o avanço da cultura da cana de açúcar, começa a acontecer a colonização da Ilha Grande, que deixa de pertencer a São Paulo e passa a ser agregada ao Rio de Janeiro.

 

No local havia extensas plantações de café e cana de açúcar, inclusive, a os produtos eram exportados para a Europa. Só na fazenda de Sant'Anna, tinha mais de cinco mil escravos.

 

Com o término de escravos, na segunda metade do século XIX, a cultura do café tornou-se inviável, sendo abandonada.

 

O Imperador Dom Pedro II resolveu adquirir a Fazenda do Holandês em 1884 (hoje, Vila do Abraão), bem como a de Dois Rios.

 

Ali na Vila do Abrão que foi construído o primeiro leprosário do país, um hospital que serviu de centro de triagem e quarentena para os passageiros enfermos que chegavam ao Brasil.

 


O Hospital ficou conhecido como Lazareto, já eu muitos estrangeiros tinham hanseníase, conhecida como doença de Lázado, por isso o nome Lazareto.

 

No outro lado da ilha, edificações construídas na Vila Dois Rios em 1893 serviu como presídio, onde os detentos eram rebeldes da Revolta da Armada.

 

Quando chega o ano de 1903 no vilarejo Dois Rios foi criada a primeira colônia penal, onde cumpriam pena presos que geralmente vinham de família muito humildes, outros até nem família tinham.

 

Eram presos perigosos e violentos, que receberam pena alta de 200 a 300 anos a cumprir.

 

Costumavam dizer que o presídio de Ilha Grande era o lugar onde o filho chorava e a mãe não ouvia.

 


Os rituais de chegada eram: Retirar do preso objetos, até mesmo fotografia, não entrava com livros, nenhum objeto.

 

Depois passavam pela verificação corporal, onde ficavam nuz, raspavam a cabeça do detento. Posteriormente uniformização, espancamento, humilhação. Minando a do detento e tornando mais fácil o controle e vigilância sobre eles.

 

A prisão tinha certas regras, sobre as quais era preciso ter controle. Os presos precisavam reconhecer rapidamente as hierarquias estabelecidas

tanto em relação aos guardas como aos demais presos.

 

Os presos que eram chamados de “vagabundos” e adjetivados

pelo número do artigo 171 estelionatário, 213 estupro e 157 roubo.

 

Se algum preso desafiasse sua autoridade ou se colocasse como sendo um igual ou superior, era imediatamente morto.

 

Por vezes eram espancados pelos guardas por algum motivo, e outras vezes porque sim também.

 

Todos os dias a chamada de detento por detento na rua, ali também havia espancamento na frente dos demais.

 

O aviso era sempre o mesmo, estavam ali para morrer.

 

Após a chamada iam para o trabalho que era determinado pelo militar, conforme a estrutura corporal.

 

Havia serviço na cozinha, na limpeza, bem como na manutenção do presídio, carregar pedra, construção, cavar buraco, colocar cerca.

 


Para se locomover dentro do presídio era preciso andar com braço cruzado, a todo momento.

 

A surda era um quarto de um metro com um tamborete para sentar e ficar em pé. De dois até dez dias. O guarda batia por horas, até esgotar.

 

O detendo pedia água, dizia que estava com dor de barriga, era quando permitiam que lavasse o rosto e fosse ao banheiro.

 

Ali ficava nu, apanhava, se cometesse outra falta, levava outro couro, ficando pelado por trinta dias.

 

O preso que fugia, assinava um contrato de extermínio. Nessa época a ordem dada aos guardas era que encontrasse o foragido, mas não que voltasse pro presídio com eles.

 

Eles fugiam pela mata, assim que os guardas achavam levavam uma surra daquelas se fosse perto da praia... piorou! Todos assistiam a agressão, jogavam o foragido dentro do mar, tirava e o pau comia.

 

Quando o criminoso era visto por populares depois de levar a surra, novamente voltava para o presídio, indo para a surda.

 


Os guardas agiam friamente, aqueles que sobreviviam a surra, pensavam duas vezes antes de cometer algum outro crime.

 

O que sobrava de opção ao detento era sobreviver, tentar fugir, tentar defender-se dos maus tratos.

 

Muitos presos desesperados tentavam fugir a nado da ilha, mas morriam afogados. Alguns presos que fugiam e tentavam roubar foram mortos por populares, na maioria das vezes mantido o tal ato em silêncio.

 

Outros ainda se viam sem saída e cometiam atos contra si próprios.

 

A violência estava lá, era um fato. Por vezes um preso matava outro. Principalmente quem tinha pena alta podia matar que o tamanho de sua pena já não importava.

 

Os que entravam sem muito tempo de condenação precisavam matar para sobreviver. E assim seguia!

 

O lugar era insalubre, celas úmidas e sujas, nenhuma higiene, eram vasos sanitários entupidos que vazavam o rejeito por toda cela.

 

A comida era preparada pelos próprios detentos que reclamavam da péssima qualidade dos produtos. Muitos até vencidos, além dos vários insetos que continham em excesso na própria cozinha, como moscas.

 

A comida também era servida pelos detentos, comiam sem uso de talheres.

 

A limpeza ficava por conta dos presos, que alegavam que não tinha material de limpeza para fazer o serviço.

 

Não era incomum os presos apresentarem sintomas de virose, outros faleciam por desnutrição.  

 

O presídio não tinha posto de saúde, nem atendimento médico. Sintomas e mortes por tuberculose era frequente. Além de outras doenças, como sífilis.

 

Da qual se adquiri por contato sexual. O que era muito comum entre eles, já que era proibido receber visitas íntimas. Preso mantinha contato sexual com outro preso.

 

E acredite ou não havia preso que quando era transferido, nem sair dessa prisão. Por isso quando recebia a liberdade, acabava matando qualquer detento para ali permanecer.

 

Enquanto Na Vila do Abraão o hospital Lazareto fechou em 1913. A Colônia de Dois Rios ia virando um verdadeiro inferno a cada dia que passava.

 

Em 1932, virou praticamente um depósito de presos que se espremiam nas celas, durante o governo Vargas o caos se instalava e o presídio não recebia somente ladrões ou chamados presos políticos.

 


Para chegar ao local os detentos eram levados em barcos tantos presos políticos, marinheiros, como presos comuns.

 

Depois encaminhados a prisão. Onde iam caminhando por 11 km acompanhados por cavalaria até chegar à penitenciária.

 

O perfil desses políticos presos, era em sua maioria homens por volta dos 25 anos. moradores dos centros urbanos e de classe média. Com formação acadêmica.

 

Foi nesse presídio que em 1936 um dos seus presos políticos foi preso, o escritor Graciliano Ramos, que mais tarde eternizou o lugar no livro "Memórias do Cárcere".

 

Em 1939 o antigo hospital desativado passou a funcionar como alojamento de fuzileiros navais. Anos depois virou presídio.

 


Portanto nos primeiros anos da década de 1940, duas instituições carcerárias funcionavam na ilha.

 

Uma na Vila do Abraão, antigo hospital Lazareto.

 

Outra em Dois Rios, chamada de Colônia Agrícola do Distrito Federal.

 

Nesse período a capital do Brasil era o Rio de Janeiro

 

No presídio em Abraão a construção ficava a beira mar, quando era maré cheia encharcava todo chão do presídio. Os presos cada vez mais doentes, tentavam fugir do local.

 

Os moradores nativos das Vilas, em sua maioria pescadores, viviam com medo dos presos que tentavam fugir. Afinal eles poderiam invadir casas e principalmente roubar barcos para fuga.

 

Já havia registros de sequestros, ameaças e roubos. As mães com medo dormiam com os filhos na cama.

 

Os moradores locais eram homens valentes. Não poderiam ficar à espera dos funcionários da penitenciária. Que por muitas vezes não davam conta de manter a ordem.

 

A vila Parnaioca, chegou a ter 1.800 moradores.

 

Certa vez um pescador, estava comendo um peixe quando viu uma mão preta aparecer na janela, pegar o peixe frito e desaparecer.

 

Pensou ele que era um preso fugitivo do Lazareto, ficou possuído de raiva pegou uma espingarda.

 


Capturou o homem que pegou o peixe, se tratava do detento conhecido como azul: matador, assaltante, famoso nos morros do Rio.

 

O pescador o deixou por duas horas com o braço esquerdo pra dentro da janela da cozinha na ponta dos pés, o pulso amarrado a um sarrafo na parede, lá embaixo.

 

Até que os guardas chegaram, antes que ele cozinhasse a mão do homem.

 

No ano de 1941 na região da baía de Dois Rios, é construído o novo presídio, um prédio de três andares com capacidade para 600 internos.

 


Os guardas eram obrigados a atender as ordens do diretor, que fazia questão de punir severamente os detentos.

 

Alguns detentos tinham trabalho fora da penitenciária, eles faziam faxina nas casas dos guardas. Alguns presos eram até mesmo babás dos militares. Outros atuavam como cozinheiros.

 

Mas vocês podem se perguntar como? Na verdade esses presos eram constantemente agredidos do mais severo espancamento.

 

A questão do alcoolismo sempre foi muito forte, a maioria dos funcionários bebiam muito. Ficavam muito violentos e descarregavam muito no preso.

 

Depois de 1940 raros presos recebiam visitas, até mesmo os presos políticos. Era uma época de difícil condições de transporte.

 

Para se chegar ao presídio era preciso ir até Mangaratiba ou Angra dos Reis, lá pegar uma lancha até a Vila do Abraão e depois seguir vigem de 11 km de estrada de chão até chegar ao presídio.

 

A viagem era demorada e cara, sobrava pouco tempo para a visita.

 

Além disso, as visitas eram rigorosas. Se o detento não era casado e só tinha uma namorada por exemplo, só poderiam a receber depois de 8 meses.

 

Portanto poucos presos recebiam visitas, além disso tinham preocupação com eles próprios. Pois se algum detento mexesse com a família de algum preso, o mesmo teria que mata-lo depois.

 


Até que depois para facilitar a visita do preso com a família montaram uma espécie de casa, onde a família ficava separada com o preso por uns dias.

 

Outras famílias alugavam casa no vilarejo para se manter perto do detento, assim muitas famílias se estabeleceram no local.

 

Na vila dos moradores a atividade pesqueira na baia da Ilha Grande em 1950 aumentou a pesca da sardinha, o que atraiu muitos descendentes de japoneses, chegando a ter mais de 20 fabricas de processamento do peixe.

 

Até que em 1954 o prédio Lazareto foi demolido e os presos que lá estavam transferidos para a Colônia Dois Rios que passou a se chamar Instituto Penal Cândido Mendes.

 


Os rituais de chegada eram os mesmos que já aderiam desde sempre: nudez, uniformização, espancamento, humilhação. O uso da surda e a violência empregada entre guarda para detendo e de detento com detento.

 

O preso que entrava para o cárcere recebia:

2 calças cinzas.

2 camisetas brancas

1 muda de roupa escura pra trabalhar

1 cobertor

2 lençóis

2 fronhas

1 colcha

1 toalha de banho e 1 de rosto

3 pares de meia

1 botina

Sabonete, creme dental, escova de dentes.

 

Semanalmente recebiam:

3 maços de cigarros,

3 caixas de fósforo,

Papel higiênico

Sabão.

 

A detenção era cercada de muros, onde muitos detentos pulavam, três pavilhões, um prédio anexo e 520 prisioneiros.

 

Cada cela abrigada 20 detentos.

 

Ali ocorreu uma divisão de alas:

 

2º galeria ficavam presos políticos. As demais ficavam homicidas, assaltantes de banco, traficantes, estupradores, ladrões, sequestradores.

 

A eles era disponível várias oficinas de trabalho, serraria, carpintaria, lavanderia, serviço mecânico.

 

Os que tinham bons comportamentos, moravam em vilas, onde também viviam os guardas e suas famílias. Alguns presos em liberdade supervisionada levaram suas famílias par ao local.

 

E foi assim que a população local tinha o mesmo hábito, principalmente de desconfiança com qualquer um que apresentasse um comportamento diferente.

 

Eram muitos os moradores que trabalharam na penitenciária o concurso era facilitado para os moradores, que iam fazer as provas em Mangaratiba com os cartões de resposta já perfurados.

 

Por causa das denúncias, houve até anulação de um dos concursos.

 

Isso porque as autoridades responsáveis procuravam incorporar habitantes locais, pois estes não traziam problemas de adaptação e conheciam bem a mata, o que era indispensável na captura dos fugitivos.

 

Além disso, o emprego na instituição penal significava, para a população local, constituída de pescadores, ascensão social.

 

A solidão dos detentos era gigante o que aumentava ainda mais a violência entre eles. Muitos eram estuprados, outros inclusive perdiam suas vidas.

 

Além disso, para saciar suas necessidades, usavam dos cachorros. Cada detento tinha um cachorro batizado com o nome de uma mulher. E usavam deles como se fosse uma mulher.

 

Até que diante de tal absurdo, o presidente do presídio chamou a carrocinha par tirar os animais da penitenciaria. O que causou revolta dos presos que fizeram uma rebelião. 

 

O que fez com que o presidente desistisse de tirar os animais, mantendo os cachorros para os detentos.

 

Enquanto os moradores nativos tinham acesso aos serviços médicos e odontológicos da prisão eram franqueados à população local, sendo amplo o atendimento.

 

Cantores, artistas, estrelas do mundo da mídia também por lá passavam.

 

As com ruas limpas, transportes sem problema para passeio, haviam dois cinemas, um em Vila Dois Rios e outro no Abraão, quadra de esporte e campo de futebol.

 

Na região os moradores não deixavam com que a bagunça se instalasse. Certa vez moradores espancaram dois turistas que foram encontrados na região portando droga.

 

Pessoas que não eram moradores da região não podiam ficar na rua depois das 18 horas. Para os nativos, aquele que não era conhecido de ninguém, já se tornava alguém suspeito.

 

Na verdade, era um ambiente dominado por desconfiança e medo, ninguém podia confiar em ninguém.

 

A ilha não era punição apenas para presos. Para lá iam guardas considerados problemáticos pelo próprio sistema. Além deles... iam também filhos e netos de guardas mais antigos.

 

Aprenderam, desde cedo, o ofício dos pais, e cresceram imersos na peculiar cultura local.

 

O antigo presídio, onde foi o Lazareto, é dinamitado e demolido, em 1964.

 

Com o Regime Militar instalado no Brasil, o período de maior tortura dentro dos quartéis. O Instituto Penal Cândido Mendes, no ano de 1965, volta a ser usado para acolher presos políticos e marinheiros que se revelaram contra a ditadura.

 

Quando chegaram à unidade, os presos políticos e marinheiros, foram isolados numa galeria.

 

Os presos políticos em sua maioria eram jovens universitários, com família bem estruturada, seu crime foi se revelar contra o governo. Não eram violentos, não conheciam o mundo criminoso.

 

Havia presos que também já haviam sido militares, outros que serviram a marinha e esperavam por julgamento, esses sabiam ler e tinham uma história de vida triste, com muitas dificuldades.

 

Bem como até padres e professores haviam sido presos, por se mostrarem contra o sistema de alguma forma. Assim ocorreu também com jornalistas.

 

Eram todos juntos e misturados com os presos de alta periculosidade, violentos ao extremo.

 

Ainda em 1964 que o jornalista Fernando Gabeira, foi preso lá. O mesmo participou do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil.

 


Entre os presos políticos, haviam algumas regras, como: não fumar maconha, não fazer sexo na prisão e não roubarem uns aos outros.

 

Como os presos políticos eram maioria naquela galeria isolada do resto da massa carcerária, foi fácil impor suas regras aos presos comuns que ali se encontravam.

 

Levaram para Ilha Grande duas organizações que eram suas marcas em todos os presídios por onde passavam: o fundo coletivo e o colegiado.

 

O fundo coletivo era uma despensa, onde se guardavam todas as comidas que as famílias dos presos políticos faziam entrar no presídio.

 

Eram frutas, goiabadas, pacotes de bolacha, eles juntavam de todos os colegas de cela e guardavam.

 

Se tinha só uma banana a mesma era dividia em 30 pra todo mundo comer, se um comia, todo mundo tinha que comer, se 10 não comiam os outros não comiam.

 

Foi assim que começou a ideia do coletivismo.

 

Depois tudo era dividido igualmente entre eles. Principalmente depois que voltavam da sala do interrogatório. Assim eram recebidos carinhosamente.

 

O colegiado era formado por 3 presos políticos escolhidos pelos seus integrantes para representar o grupo na administração do presídio, esses falavam e debatiam sobre melhorias no local.

 

A integração entre os presos políticos, marinheiros e demais presos acontecia em aulas de artesanato ou na prática de esportes.

 

No futebol, os detentos organizaram um time: o 25 de Março, numa referência à data do levante de marinheiros contra a ditadura militar.

 

Assim os presos políticos ganharam a confiança da massa carcerária, incluindo os guardas.

 


Os presos políticos criaram uma farmácia que servia tanto à

guarda, como à família dos guardas, a família dos PM‟s, servia

também pros presos comuns.

 

Além disso, fizeram uma biblioteca, mas só funcionava entre os

próprios presos, chegando a ter livros de autores marxistas após 1974, sem nenhum tipo de censura.

 

Eles mudavam as capas dos livros e o diretor nem sabia da existência dessas leituras, bem como alguns livros do cheguevara, entre outros que ensinavam como construir túneis e fabricar armas simples com o que tinham.

 

Até porque o diretor ouvia um preso pedir a outro detento: Me da um livro pra ler daqueles de sacanagem... Jamais ele imaginava que leitura esses presos estavam tendo acesso.

 

Pra passar um livro eles quando iam atravessar um corredor, deixava em tal cela, depois era devolvido.

 

Alguns presos não sabiam ler, mas para ajudar a expandir as leitura copiavam, como se desenhassem letras. Assim era cada ver mais possível dividir conhecimento.

 

Outro preso que tinha habilidade pra desenho, fazia capas de livros totalmente diferente do conteúdo que continha nos textos.

 

Houve também uma série de cursos, promovidos pelos presos políticos em sua galeria. Com intenção de formar grupos de discussão, movimentos e organizações.

 

Para conseguir algumas coisas como por exemplo a visita os presos políticos faziam greve de fome.

 

Melhoraram o nível escolar de alguns presos. Por exemplo aula de curso primário para aqueles que eram analfabetos. E foi assim que surgiu o termo companheiro entre eles.

 

Tinham estudos de economia, filosofia, sociologia, inglês, tinham até aula de elétrica.

 

Durante o dia, eles trabalhavam, alguns na cozinha, outros na lavanderia, outros na faxina, serralheria, mecânica, depois iam par ao banho, fabricavam bolsas de couro, carteiras.

 

Muitos presos não queriam fazer curso nenhum, usavam do tempo pra dormir, outros só queriam ler depois que aprenderam, alguns tentavam  arrumar confusão, principalmente tentar fuga.

 

Ainda em 1969 presos que fizeram rebelião na penitenciária Lemos de Brito foram enviados a Ilha Grande, no caldeirão do diabo. Como forma de castigo.

 

Aquele presídio era o terror pra qualquer criminoso. 

 

Porém aquele ano foi um marco de mudanças, dentro do sistema.

 

O Decreto-lei, número 898, de 29 de setembro de 1969 modifica alguns artigos da Lei de Segurança Nacional (LSN).

 


A partir de então, qualquer pessoa que pratique crimes como assalto, sequestro ou roubo será punida, independente que seu crime tenha ou não intenções políticas.

 

Tem, então, início uma série de embates dos presos com autoridades em que relatam greves de fome, abaixo-assinados, denúncias de espancamento e maus-tratos.

 

A chegada de criminosos de assaltes a banco foi um grande problema, pois comentavam com demais detentos como faziam assaltos e sequestros sem chamar atenção.

 

Além disso, foi um período que ocorria vários assaltos na área urbana e tudo era divulgado na mídia, os ocorridos passo a passo. Além da forma que ocorriam os assaltos ao banco em outros países.

 

O que inspirariam os criminosos a planejar como fariam, assim que tivesse sua liberdade.

 

Pois assim que os detentos entravam na cela, aquele que se demonstrava mais vulnerável era abusado por uma semana por 6 a 8 detentos, toda noite. Não era difícil que alguns desistia da própria vida.

 

Acabava dando o fim em si mesmo, ou perdiam sua vida pelas mãos de demais detentos.

 

No ano de 1970 o presídio era berço dos assaltantes de banco.

 

Foi ainda em 1972 que William da Silva Lima, conhecido como professor foi parar no presídio de Ilha Grande. Um dos fundadores da falange vermelha, que depois passou a se chamar cv.

 

Nesse período o presídio seguia na mesma proporção de violência, um preso que não se submetia as regras impostas por outro preso era imobilizado por demais enquanto levava vários golpes de faca.

 

Nem mesmo o guarda conseguia impedir, já que os detentos faziam barreira.

 

Mas após esses acontecimentos, todos os envolvidos passavam pelo que chamavam de corredor polonês, onde iam passando para levar mais surras dos guardas.

 

Muitos deles se machucam em nesse corredor, com metais, pregos e assim seguia o ritmo.

 

A interação dos presos políticos com os outros presos comuns como diziam, incluindo traficantes, homicidas, ladrão de bancos e assim por diante.

 

Gerava preocupação na administração do presídio, chegaram a pedir às autoridades judiciárias que evitassem esse contato, pois geraria problemas a ordem do presídio.

 

Pra piorar tudo os presos oriundos das organizações armadas dos anos 70 também tinha regressado à Ilha Grande.

 


Esse grupo alegou incompatibilidade de hábitos e de ideologias e pediram que a galeria fosse dividida.

 

Colocaram chapas de aço para dividir em pequenas celas o que ficou conhecido como "Muro da Vergonha".

 

Formaram 20 cubículos com espaço para comportar um detento, só que na verdade ficavam quatro a cinco pessoas. E essa tortura sobrou para os detentos do fundão ter suas celas diminuídas.

 

Eram presos em tranca dura, com direito de circulação pela galeria apenas nos instantes que antecediam o café-da-manhã e o almoço".

 

Essa divisão levou a uma mobilização conjunta e conscientização da massa carcerária. Os presos do Fundão iniciaram o período em que queriam liderar a cadeia.

 

Em 1979 Os grupos passam a se organizar cada um com sua falange.

 

A falange vermelha, ADA, falange Jacaré

 

Entre seus criadores dos vermelho futuro cv, estavam os traficantes Rogério Lemgruber, o Bagulhão, William da Silva Lima, o Professor, e José Carlos dos Reis Encina, o Escadinha e o irmão dele José Paulo dos Reis Encina ("Paulo Maluco")

 

Os dois irmãos eram os uns dos mais temidos criminosos do Brasil durante as décadas de 1970 e 1980.

 

Assim os detentos faziam pressão em cima da administração para organizar os grupos, mas na verdade precisava de carisma do grupo para que mais um detento entrasse para aquela falange que denominavam ser mais segura.

 

Na falange vermelha era a proibido qualquer ato de violência de preso contra preso. As incompatibilidades pessoais deveriam ser deixadas de lado.

 

Para conseguir mais união entre detentos se comunicavam com outro preso que precisava de acolhimento. Assim eles diziam para o novato que os ladrões roubariam o que eles tinham.

 

Mas se caso se unisse a falange vermelha todos tomavam suas dores, mas da seguinte forma. Os do grupo dariam fim no abusador, mas ele deveria assumir a culpa.

 

Era uma forma de sobrevivência, mas ao mesmo tempo de ser leal ao grupo, já que eles compraram briga que não eram deles.

 

E se caso não cumprisse com a palavra era morto, não importava se era grande ou forte.

 

Dessa forma o grupo dos sanguinários já não poderia fazer o que bem intendia, já que tinha rivais dentro do presídio.

 

Diante dessas situações os guardas agiam contra os presidiários. Utilizavam uma palmatória de madeira, um instrumento esculpido tipo uma colher de pau com uns furinhos.

 

Em cada agressão fazia o preso se contorcer e berrar de dor, se jogavam contra a parede desesperados.

 

Mesmo depois que os presos políticos ganharam a liberdade os grupos continuaram com a organização que aprenderam com os antigos companheiros que eram presos políticos. 

 

Passaram a fazer denúncias nacionais e internacionais contra a tortura. Chegaram até a escrever cartas e mandar para o Papa, para a Anistia Internacional, para a Cruz Vermelha.

 

A falange vermelha se organizava cada vez mais, até que a assistente social que atuava no presídio desde quando havia os presos políticos, passou a olhar para esse grupo.

 

Conseguiram ajuda de assistência com advogados, tudo em busca da liberdade.

 

Ela os via como mais fracos e que deveria haver mais igualdade e que a violência acabasse.

 

Assim ela os ajudou a fazer denúncias, uma série de embates com as autoridades. Para forçar essa atenção do governo passaram a fazer também greve de fome e abaixo-assinados.

 

E ali iniciou as leis ditas por eles, todas as segundas feiras chegavam novos detentos. E era exatamente nesse dia da semana que era marcado a morte.

 

Não à toa que nas primeiras horas de segunda feira do dia 17 de setembro de 1979, um grupo de detentos armados com pedaços de madeira cheios de pregos.

 

Eram colheres raspadas transformadas em faca, foi assim que encurralaram um bando rival dentro da penitenciária e assassinaram seis presos adversários.

 

Quando foi quase totalmente exterminada a Falange do Jacaré, a Falange da LSN ou Comando Vermelho passou a imperar no presídio da Ilha Grande e a comandar o crime organizado.

 

Aquele episódio foi ser considerado o ato de violência inaugural da facção criminosa Falange Vermelha.

 

Passaram a controlar as ações criminosas e o tráfico de drogas nas cidades, de São Paulo e Rio de Janeiro de dentro do presídio, decidiam a vida e a morte de detentos dentro do presídio de Ilha Grande como dos demais presídios.

 

Com isso, as outras falanges ficaram oprimidas, passando a acatar as ordens dos vermelhos sob pena de morte".

 

O grupo era temido pela união e o modo organizado de fazer as coisas, principalmente as várias fugas.

 

Tudo isso, para ter mais dinheiro e conseguir a liberdade de todos do grupo. Além disso, o foco do domínio dos morros e comunidade. 

 

Nos presídios e morros eles dominavam as vendas de drogas, onde todos que mais tinham condições eram obrigados a colaborar com dinheiro, até mesmo quem nem estava preso.

 

Sabendo eles que muitos tentavam fugir a nado, passaram a fazer um esquema de travessia da ilha. Alugavam barcos que ficava esperando em local estratégico.

 

Para isso, usavam de um criminoso que era chamado de robô.

 

O Robô se escondia na mata enquanto o escolhido do grupo poderia fugir, geralmente escolhiam assaltante de banco. Pois lá fora levantaria dinheiro para o grupo mais rápido.

 

Os guardas iam em busca do Robô, dando espaço para o escolhido fugir até o ponto de encontro para chegar ao Rio de Janeiro.

 

Assim que o guardas capturavam o Robô, não tinham mais folego para ir atrás no novo foragido.

 

Em 1980 Saldanha o Bigode, fugiu de Ilha Grande e retomou ao roubo de 12 bancos. Integrando a "quadrilha do paletó" e corrente de ouro.

 


Bem vestido entrava no banco e pegava o dinheiro do caixa, jamais prejudicar o cidadão comum.

 

Não demorou muito para que muita gente começasse a enaltecer a atitude do comando.

 

Se escondia em um apartamento num condomínio de luxo, na Ilha do Governados, ninguém desconfiava dele e de mais 6 criminosos que o acompanhavam.

 

Até que dia 3 de abril de 1981. Zé Bigode perde a vida, depois de mais de 11 horas de tiroteio ele sozinho contra 400 policiais que cercaram o prédio usando potentes armas contra o criminoso.

 

Nada o detinha! Os policiais usaram picareta pra quebrar parede do apartamento, incendiaram 2 apartamentos, usaram granadas, mas o homem parecia inatingível.

 

Até que Zé Bigode é atingido no peito as 8:15 da manhã

 

Esse episódio coloca em evidência, na mídia, a Falange Vermelha. Começando a propagar, a partir da própria polícia, que “a organização Falange Vermelha nasceu da convivência entre assaltantes e presos políticos.

 

Os presos apresentados à época como líderes da Falange, eram José Lourival Siqueira Rosa, o Mimoso; Carlos Gregório, o Gordo e José Carlos dos Reis Encina, o Escadinha.

 

José Lourival Siqueira Rosa o Mimoso, ainda em 1981, quando preso e apresentado em público como líder da Falange, responde: “Não sou líder de coisa nenhuma. Esta organização não existe. É invenção da polícia e da imprensa”

 

Em 1985 o presídio Cândido Mendes é palco de uma das mais espetaculares fugas da crônica policial.

 

No último dia do ano, o traficante José Carlos dos Reis Encina, o Escadinha, um dos criadores da falange vermelha foge da penitenciária resgatado por um helicóptero.

 


A falange vermelha passou a ser intitulada como "CV" (Comando Vermelho). Até que em 1988 os principais líderes do grupo foram  transferidos para o presídio Bangu I.

 

1994 - O restante dos presos é transferido para a Penitenciária Vicente Piragibe.

 

Junto com a retirada dos presos, todo o aparato administrativo da penitenciária foi desfeito; agentes e policiais transferidos para outros complexos penais e a região abandonada.

 

No entanto, muitos dos ex-funcionários do Instituto Penal mantiveram

suas moradias na ilha, onde nasceram, foram criados e se casaram.

 

Lá também viveram seus pais e avós, da mesma maneira que hoje

vivem seus filhos e netos. Alguns dos policiais que chegaram de

fora também continuaram na região, uma vez que lhes foi permitido

manter as casas oficiais.

 

Em 02 de abril de 1994, por ordem do então governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola e do secretário de Justiça Nilo Batista, o prédio principal do Instituto Penal Cândido Mendes é implodido com 200 quilos de dinamite.

 


Iniciou-se o desenvolvimento do turismo na Ilha Grande. Aa casas de ex-funcionários do presídio foram adaptadas para receber os visitantes, consequentemente se tornaram pousadas.

 

Porém os moradores se sentiram desprotegidos.

 

Em abril de 2000, houve, por parte do governo, a intenção de

reconstruir na Ilha Grande novo presídio. Mas a proposta dividiu opnião dos moradores das vilas, o que fez com que tudo continuasse na mesma.

 

Afinal os que vivem do comércio local e de pousadas a situação melhorou.

 

Já outros moradores diziam que sem o presídio gerou mais pobreza e abandono. Deixando muitas crianças sem escola. Além disso, o presídio  traria emprego e segurança,

 

2009 – O então governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, inaugurou o Museu do Cárcere em Dois Rios. Onde possui exposições de fotos, documentos, objetos e equipamentos do antigo Instituto Penal Cândido Mendes.

 

http://www.ilhagrande.org/pagina/linha-do-tempo-ilha-grande

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Conclusão

O oceano de dor, passado e presente, nos cercou,

e seu nível aumentou de ano para ano até que

ele praticamente nos submergiu.14

Neste artigo, procurei, em primeiro lugar, mostrar que práticas

da violência podem manter-se em diferentes contextos enquanto tive14 Levi, 1988, p. 86.

217

rem suporte em códigos morais precedentes. Práticas estabelecidas no

passado são mantidas no presente por meio de múltiplos encontros

e configurações. Hábitos oriundos de contextos passados entram

pelo presente como se fossem parte deste e é difícil reconhecermos

o que é passado e o que é presente. Também busquei expor que há

uma negociação da violência entre os atores envolvidos no sistema

carcerário. O sistema impôs uma dinâmica no cotidiano da vida de

presos e guardas, estabelecendo leis, regras e normas de conduta, que

se consolidaram em formas de ser, pensar e agir cuja origem não é

facilmente identificada. É nessa zona cinzenta que se movem atores

com códigos morais próprios, muitas vezes em total contradição com

valores sociais estabelecidos, o que lhes permite agir com ambigüidade, vilipendiando o próximo e mostrando ternura. Por último, apontei

os impasses na construção dessa violência quando códigos morais

da sociedade mais abrangente estão em jogo, bem como os limites

que se nos apresentam para descrever esses processos de construção

e interpretação da violência.

No imaginário popular, a história dos presídios da Ilha Grande

tem-se associado a uma história de arbítrio e de degradação física e

moral do ser humano. A ilha foi chamada de “Ilha do Medo”, “Inferno

Verde”, “Sucursal do Inferno”, “Ilha dos Homens sem Alma” e “Caldeirão do Diabo”. As práticas de aviltamento e indignidade sofridas

na Ilha Grande foram denunciadas no mundo escrito, primeiro por

presos políticos e, recentemente, por outros presos. Em comum, nos

diversos relatos, há a constatação de que o inferno era construído por

seres humanos: detentos que estupravam, roubavam e matavam outros

detentos, e policiais que, com suas práticas corretivas, marcaram a

instituição enquanto cárcere do inferno (Lessa, 1933; Ramos, 1953;

Torres, 1979; Lima, 1991; Cypriano, 2001).

As práticas da violência não foram um privilégio da Ilha Gran-

218

de. No mundo inteiro os presídios são violentos, e a prisão na Ilha

Grande, por pior que tenha sido, compartilha com outras a posse da

violência (Coelho, 1976). Mas o que nem a imprensa, nem a entrevista

gravada conseguem transmitir é o grau de irracionalidade presente nas

práticas correntes. Nós temos uma pista de seu significado, resvalamos

por perto de seu sentido, quando uma assistente social nos diz ter ali

presenciado uma experiência limítrofe. Mas como compreender esse

manancial de horrores, que aponta os limites tênues entre moral e

degradação humana? Teremos palavras para isso?


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